Notas sobre o momento histórico atual – Parte III

III – A RESPEITO DO PARTIDO DOS TRABALHADORES

por Coletivo CVM

1. A criação do partido traz as marcas da conjuntura da época. Constituído em 1980, o partido foi a solução encontrada pelos dirigentes sindicais denominados “autênticos”, dentre os quais os do ABC, com Lula na liderança, para o bloqueio à constituição dessa corrente no interior do PMDB. Essa recusa e o contexto das lutas econômicas de cunho político (greves contra o arrocho salarial) favoreceram a influência difusa de diversas organizações de esquerda que optaram por se organizar como tendência ou, como no caso da Polop, acabaram por se dissolver no PT para estruturar-se nos núcleos de base que conferiam ao partido seu caráter de massa. Daí a convivência da bandeira do socialismo – que nunca foi uma finalidade da luta, jamais passou de uma alternativa genérica ao capitalismo – com a orientação política democrático pequeno-burguesa mediante a qual o partido inseria-se na dinâmica da redemocratização política burguesa em curso nesse período.

Essa dinâmica de integração à sociedade burguesa pelo caminho das disputas eleitorais em todos os níveis foi sustentada pela liderança sindical, pela Igreja e pela esquerda oriunda das cisões no velho PCB – Dissidência de São Paulo, Aliança de Libertação Nacional, etc. – conhecida pelo nome de Articulação e mais recentemente pelo de Corrente Majoritária. As executivas estaduais e a nacional foram controladas, em geral, por esta Articulação.

2. O “eleitoralismo” foi uma tendência precoce, perceptível, por exemplo, na tentativa de controlar o processo de sucessão em diversas prefeituras, ao invés de utilizar o processo eleitoral para fortalecer a participação popular no exercício direto do poder local, ou ainda, quando, em 1989, o PT, arrecadava recursos de campanha junto à Odebrecht.

3. O descenso do movimento de massas da classe operária ao longo dos anos 1990-2000 e a derivação do núcleo sindical da CUT para a política de colaboração de classes são aspectos essenciais para se compreender a trajetória do PT acima esboçada.

4. Tudo isso aponta a necessidade de um balanço crítico dessa trajetória que, certamente, precisa incluir a daquelas tendências partidárias dele excluídas e que deram origem a partidos como o PSOL, PSTU e PCO.

5. O PT é atualmente o resultado desse processo de integração à dinâmica política da sociedade burguesa no Brasil. Do ponto de vista dos seus métodos e da organização não se diferencia de um partido burguês como os demais. Entre os parlamentares que aglutinam tendências politicas e as executivas que controlam o funcionamento do partido e impõem verticalmente as alianças nas disputas para as prefeituras e os governos estaduais, não há fóruns de discussão e, portanto, possibilidades reais de disputa política. A filiação, por outro lado, é um processo massivo, sob controle das executivas estaduais.

6. O partido baniu do vocabulário político termos como capitalismo, socialismo, trocando-os pela “inserção dos mais pobres” e, a partir da retomada do crescimento da economia, já como instrumento de mobilização político eleitoral das classes trabalhadoras de sustentação dos governos de Lula e de Dilma, passou a orientar-se também pela ideia da constituição de uma nova “classe média”, essa representação política de uma massa de trabalhadores com capacidade de endividar-se e, portanto, de consumir. A meta de “zerar a pobreza indecente” implica a organização de um programa de combate ao pauperismo oficial, o Bolsa Família, enquanto manobrar a massa da “classe C” requer a sustentação do crescimento econômico, agora rebatizado de “social-desenvolvimentismo”. Tornou-se, em consequência, instrumento político de sustentação do Estado burguês no Brasil, com uma ideologia pequeno-burguesa, de conciliação de classes, expressa na ideia do “Brasil: um governo de todos nós”, voltado para o desenvolvimento capitalista com maior distribuição de renda (o propalado “social-desenvolvimentismo”).

7. Qual a posição que se deve assumir diante do PT? Face à caracterização acima descrita, não há como pretender, até por absoluto irrealismo político, disputar qualquer influência em termos da direção política. Tal atitude não implica ausência da crítica; esta deve ser exercida, porém, em circunstâncias concretas junto a um público operário, nas quais possa ocorrer o seu aprendizado político, mesmo limitado. As experiências do movimento operário internacional desde fins do século XIX em diante, principalmente dos quatro primeiros congressos da Internacional Comunista, precisam ser resgatadas para dar sentido à crítica atual ao papel do PT, particularmente no que diz respeito à tática eleitoral e especialmente à questão dos governos operários e camponeses, surgidos em situação de crise da hegemonia burguesa.

8. O equívoco das tendências de esquerda remanescentes no PT consiste em supor que possa “acumular forças” mediante a crítica interna para então romper com a direção adotada pelo partido.  Não há amadurecimento político de forças operárias sem as lutas contra os interesses da burguesia, encaminhadas de modo independente.  Sem esse aprendizado próprio, as forças operárias vinculadas ao PT continuarão atreladas às limitações pequeno-burguesas características do partido O partido revolucionário nada mais é do que a vanguarda, a camada mais avançada do movimento operário que, mediante a teoria revolucionária, ajuda a discernir, nas condições de luta, a relação entre os meios e os fins, desenvolvendo-se como consciência de classe nesse mesmo processo. Há de se ter presente, então, que a formação do partido depende de um novo ascenso de massas e da atuação de núcleos avançados da classe operária.

Referências utilizadas:

Acordo Coletivo Especial. Publicação Especial do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, setembro de 2011. 52 p.

Pichler, Walter Arno. Trabalho e emprego: tendências da sindicalização no Brasil: 1992-2009. Indicadores Econômicos F.E.E., Porto Alegre, v.38, n.3, p.37-46, 2011.

Secretaria de Políticas Públicas de Emprego/MTE. Termo de referência para avaliação técnica de entidades executoras a serem contratadas no âmbito dos Convênios Únicos do Sistema Público de Emprego, Trabalho e Renda. Brasília, março de 2006.

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Notas sobre o momento histórico atual – Parte I, II e III

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