Lições da greve nos Correios para a luta dos trabalhadores e das trabalhadoras hoje no Brasil
Cem Flores
02.10.2020
A greve ensina os operários a compreenderem onde repousa a força dos patrões e onde a dos operários, ensina a pensarem não só em seu patrão e em seus companheiros mais próximos, mas em todos os patrões, em toda a classe capitalista e em toda a classe operária. Quando um patrão que acumulou milhões às custas do trabalho de várias gerações de operários não concede o mais modesto aumento de salário e inclusive tenta reduzi-lo ainda mais e, no caso de os operários oferecerem resistência, põe na rua milhares de famílias famintas, então os operários veem com clareza que toda a classe capitalista é inimiga de toda a classe operária e que os operários só podem confiar em si mesmos e em sua união. Acontece muitas vezes que um patrão procura enganar, a todo transe, os operários, apresentar-se diante deles como um benfeitor, encobrir a exploração de seus operários com uma dádiva insignificante qualquer, com qualquer promessa falaz. Cada greve sempre destrói de imediato este engano, mostrando aos operários que seu “benfeitor” é um lobo com pele de cordeiro. Mas a greve abre os olhos dos operários não só quanto aos capitalistas, mas também no que se refere ao governo e às leis. […] O operário começa a entender que as leis são ditadas em benefício exclusivo dos ricos, que também os funcionários defendem os interesses dos ricos.
Lênin. Sobre as Greves, 1899.
A greve dos Correios chega ao fim – os ataques do patrão, não
No dia 21 de setembro ocorreu o julgamento da greve dos trabalhadores e das trabalhadoras dos Correios no Tribunal Superior do Trabalho (TST). O TST não julgou a greve formalmente abusiva e decidiu por um reajuste salarial de 2,6% para a categoria, ao contrário da posição da empresa.
A verdadeira dimensão do julgamento, no entanto, foi contrária, na prática, à greve, mediante multa diária de R$ 100 mil, e contrária à categoria ao cancelar, arbitrariamente, cinquenta cláusulas do Acordo Coletivo, inclusive várias conquistas históricas (algumas de mais de 10 anos), mantendo apenas cláusulas sociais sem impacto financeiro para a empresa.
O imenso ataque patronal contra os/as trabalhadores/as, que se utilizou do fim da ultratividade (garantia de manutenção do acordo coletivo), conquistado pelos patrões na reforma trabalhista de Temer, portanto, tinha sido ratificado também pela dita justiça do trabalho, seguindo o julgamento anterior realizado no STF. O efeito sobre os salários e as condições de trabalho dos/as trabalhadores/as será forte: alguns chegarão a perder quase metade de sua renda mensal, além de terem vários benefícios excluídos.
A decisão do TST foi também, na realidade, uma imposição de volta ao trabalho. Apesar de a greve não ter sido formalmente considerada abusiva, o tribunal ameaçou multar os sindicatos em R$ 100 mil por dia caso os/as trabalhadores/as continuassem a greve.
Depois de 35 dias, uma das mais longas e fortes greves de 2020 chegou ao fim e a categoria retornou aos seus postos de trabalho, tendo que repor metade dos dias parados e a outra metade cortar de seus próprios salários.
Mas o inimigo não parou por aí! Nos dias seguintes, o governo veio a público reafirmar a intenção de privatização da empresa. Segundo o Valor Econômico, os militares palacianos já teriam dado aval para a venda, para a abertura total do mercado de correspondências e entregas para monopólios privados (nacionais e internacionais).
A categoria bem sabe o que isso significa: demissões em massa, redução ainda mais violenta de salários e conquistas, bem piores condições de luta. E por isso, na própria greve, já iniciaram uma campanha contra a privatização da empresa e têm consciência da grande chance de que esse seja o próximo ataque do inimigo. leia mais