Fatos & Crítica nº 25: 2021: ano de miséria, fome e doença?
O ano marcado pela pandemia do novo coronavírus vai chegando ao seu final e fica a pergunta inevitável: o que esperar do ano de 2021?
Economia em baixa, desemprego e carestia
No plano econômico, o governo comemorou o crescimento do produto interno bruto (PIB) de 7,7% no terceiro trimestre deste ano, em relação ao trimestre imediatamente anterior, mas as estimativas oficiais para o ano de 2020 como um todo continuam apontando para uma retração econômica entre -4,5% e -5%, mais grave ainda que as observadas nos anos recordistas de 2015 e 2016.
Esse número só não foi pior, porque as medidas de auxílio emergencial e de complementação salarial dos trabalhadores afastados foram capazes de fazer girar minimamente a roda da economia, evitando também uma catástrofe social. Cedendo os anéis para não se arriscar a perder os dedos, o governo esqueceu momentaneamente suas convicções de controle dos gastos públicos e liberou valores equivalentes a 8,6% do PIB, elevando o déficit primário de 2020 aos níveis estratosféricos de 12,7% do PIB.
Com o fim em dezembro do auxílio emergencial para 60 milhões de trabalhadores desempregados ou do setor informal e da complementação salarial para os trabalhadores afastados de seus empregos, prevê-se que em 2021 o rendimento das famílias terá uma queda de -5,3% em relação a 2020.
Para agravar esse quadro, o preço dos alimentos e bebidas sofreu um acréscimo de 15,94% nos 12 meses terminados em novembro deste ano, o que deixará os trabalhadores empregados, desempregados ou ocupados em atividades informais em condições de subsistência ainda piores no próximo ano.
O quadro de desemprego só se agrava a cada mês em que as estatísticas são divulgadas. Com as medidas de flexibilização, que permitiram a muitas pessoas voltar a procurar emprego no 3º trimestre, o número de desempregados chegou a 14,1 milhões de pessoas, ou seja, 14,6% da força de trabalho.
Considerando também os subocupados e os desocupados que não procuraram emprego, a subutilização da força de trabalho no Brasil chegou a nada mais nada menos que 30,3%, segundo as estatísticas oficiais.
Pandemia volta a acelerar
A flexibilização das medidas de isolamento social permitiu alguma recuperação econômica, mas também colaborou para o recrudescimento da pandemia: o número de mortes diárias voltou a se acelerar e a se aproximar das cifras observadas em maio, da ordem de 650 óbitos a cada 24 horas.
Ocorre que agora a disposição da população e dos governos locais para tomar as medidas de prevenção necessárias ao controle da pandemia é muito menor que nos meses iniciais, o que só propicia a difusão do vírus, lotando as unidades de atendimento do sistema de saúde. Pessoas aguardando vaga em UTI já são a apavorante realidade em muitas cidades do país.
A única medida que poderia minorar essa situação seria a vacinação em massa, mas para isso o governo de Bolsonaro não consegue, ou não deseja, articular minimamente os esforços para contar com o maior número possível de doses de vacina, a serem aplicadas segundo um plano de imunização nacional, em que todos os insumos estejam à disposição no local e no tempo devidos.
A demora em apresentar um plano deu ensejo a que um Ministro do STF o exigisse das autoridades sanitárias. Em resposta, o Ministério da Saúde encaminhou um documento genérico, assinado por cientistas que dele sequer tiveram prévio conhecimento. Mais tarde, divulgou um plano cujo cumprimento é bastante duvidoso.
Ocorre que o capitão na Presidência da República subestima a epidemia e nutre uma ojeriza por vacinas de um modo geral e pela Coronavac em particular – seja por ser chinesa, seja por ser patrocinada por seu adversário João Dória – e faz o que está ao seu alcance para criar obstáculos a sua distribuição, no que é cegamente obedecido pelo general à frente do Ministério da Saúde.
A própria entidade responsável pela aprovação da vacina – a ANVISA – chegou ao cúmulo de divulgar uma nota colocando em dúvida a seriedade do órgão chinês congênere, já que uma lei brasileira recente permitiria tomar seus resultados (ou de outras agências internacionais) como conclusivos e suficientes para a aplicação da vacina no Brasil.
Em mais um capítulo revelador da resistência de Bolsonaro ao programa de vacinação, ele divulgou a opinião de que quem se vacinasse teria que obrigatoriamente assinar um termo de responsabilidade. Com essa propaganda negativa em relação à imunização, não é à toa que o número de pessoas que dizem que não pretendem se vacinar no Brasil pulou de 9% para 22%, entre agosto e dezembro.
Ou seja, tudo indica que o programa de vacinação brasileiro sofrerá com a falta de coordenação, com a limitação dos insumos disponíveis, com a distribuição geográfica desigual e, principalmente, com o descrédito, resistência ou boicote por parte das autoridades que deveriam estar à frente do processo. O resultado disso será a elevação exponencial do número de vítimas da doença, hoje já ultrapassando a casa dos 190.000.
Resultado eleitoral ruim para o bolsonarismo
E no plano político, o que se pode esperar dos resultados das eleições municipais?
Os órgãos da mídia burguesa saudaram efusivamente os resultados eleitorais de 2020, porque – em sua avaliação – os “extremos” teriam sido derrotados, em favor de uma alternativa “equilibrada” de centro. Vão assim tentando tecer uma opção para 2022 que os livre, ao mesmo tempo, do PT e de Bolsonaro, cujo governo se mostra cada vez mais disfuncional em muitas dimensões importantes para a burguesia brasileira, como em sua política externa, no combate à pandemia e no ataque às pautas identitárias (mesmo que esterilizadas de qualquer conteúdo anticapitalista, como deseja a classe dominante).
É certo que a burguesia ainda mantém, apesar de tudo, a confiança de que o governo Bolsonaro venha a atender a suas expectativas no campo da política econômica e trabalhista. Segundo a Confederação Nacional das Indústrias, o ICEI (Índice de Confiança do Empresário Industrial) mostra que os empresários da indústria seguem confiantes em dezembro (pelo quinto mês consecutivo), mês este em que a indústria ultrapassou os níveis de produção de antes do início da pandemia.
Mas a classe dominante também se ressente de que o governo não vem se articulando suficientemente no Congresso para a aprovação mais rápida do programa hegemônico do capital financeiro, o que inclui a redução do funcionalismo público e da máquina estatal, as privatizações e a reforma tributária. leia mais