Boletim de Conjuntura Nacional Nº 11: A crise de Agosto de 2015

Coletivo CVM

 

O momento político atual

A situação nacional desde o final de 2014 configura-se como uma crise política em marcha, potencializada por uma crise econômica. A oposição burguesa, liderada pelo PSDB, assumiu abertamente defesa do impeachment (Aécio Neves) ou a renúncia do governo Dilma-Temer (Fernando Henrique Cardoso). Em agosto do corrente ano, a crise assumiu proporções críticas, com as ações do Tribunal de Contas da União e do Tribunal Superior Eleitoral contra o governo. A falta de unidade dos representantes políticos da oposição, agora incluída na base de apoio do governo Dilma, isto é, no PMDB, inviabilizou a derrubada “legal” do governo e propiciou a primeira manifestação aberta da burguesia em favor da estabilidade e de aceitação dos resultados da eleição presidencial. Permanece o problema de um novo acordo político capaz de dar sustentação parlamentar ao governo. Devemos, portanto, ainda caracterizar essa situação nos termos de um jogo de soma zero ou nula porque inexiste uma força política capaz de superá-la imediatamente.

Lembremos, resumidamente, os fatos. A decisão de Dilma Roussef de entregar o comando da política pública, em janeiro de 2015, para Joaquim Levy, expressou o esgotamento da política econômica denominada “anticíclica” praticada desde 2011, de desoneração da folha de pagamentos das empresas, controle de preços administrados e oferta de crédito a juros baixos, substituindo-a por uma conservadora, de aumento da taxa de juros, liberação dos preços administrados, contenção do gasto público e redução de benefícios assegurados por direitos, a exemplo do seguro-desemprego. Esta nova política precipitou a recessão econômica e fez a inflação disparar, com as inevitáveis consequências do desemprego e rebaixamento dos salários. Advirta-se logo que a mudança na política econômica não alterou o bloco das classes no poder do estado burguês.

Esta virada da política econômica, por sua vez, acentuou a perda das bases de apoio social que caracterizou o governo Dilma a partir dos protestos de junho de 2013. Desde então a pequena-burguesia entrou na cena política para demonstrar, com seu descontentamento, que o projeto do PT (de Lula) estava esgotado. Quando a “Operação Lava-Jato” se aproximou do governo Dilma, sob intenso foco da mídia burguesa, o cerco assumiu contornos de um movimento pelo impedimento da presidente, no qual se fizeram ouvir ecos da direita golpista. Imersas numa situação defensiva, os trabalhadores não se contrapuseram a este cerco político.

Como os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado tornaram-se alvos da Operação, a crise tornou-se abertamente política e o cenário, como assinalamos em Fatos & Crítica Nº3,  passou a ser marcado pela balbúrdia entre os porta-vozes das classes dominantes.

A crise, em agosto, parecia então conduzir à queda da presidente, por meio do impedimento de seu mandato tanto pela denúncia de abuso do poder, fraude e corrupção proposta pelo PSDB e coligação derrotada na eleição presidencial do ano passado e aceita pelo Tribunal Superior Eleitoral, como pela arguição do Tribunal de Contas da União de irresponsabilidade fiscal nos gastos públicos realizados em 2014.

Entretanto, a burguesia entrou na cena política por meio das federações das indústrias de São Paulo e do Rio de Janeiro e do presidente do Banco Bradesco em apoio o governo de Dilma para assegurar a “estabilidade dos negócios”. Assim, a pauta burguesa confrontou-se com a pauta conservadora e parcialmente contraditória dos principais políticos ameaçados, Renan e Cunha e de seus aliados na oposição.

Nesse quadro de realinhamento de forças, Rodrigo Janot, reconduzido ao cargo como procurador-geral da República pela presidente Dilma Roussef em 8 de agosto, assumiu o arquivamento do pedido de investigação encaminhado pelo vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Gilmar Mendes, a pedido de Aécio Neves e sua articulação de campanha. O arquivamento, feito em 13 de agosto mas tornado público em 28 de agosto, baseou-se nas decisões da própria corte, pois as contas haviam sido, apesar das ressalvas, aprovadas; além de argumentar não caber questionamentos após a diplomação do candidato eleito, Janot declarou que a pretensão da oposição em anular o pleito de 2014 era o resultado de controvérsias que não interessava à sociedade (quer dizer, à democracia burguesa) perpetuar e que devia preparar-se para disputar o poder em 2018.

Nesse contexto, as manifestações contra (16 de agosto) e a favor (20 de agosto) do governo Dilma, pouco expressivas numericamente, constituíram-se mais em atos para demarcar posições frente a um jogo decidido nas “alturas” do Estado burguês.

 

Poder judiciário e o caráter ditatorial da democracia burguesa

Necessário fazer aqui um breve parêntese para analisar alguns aspectos do papel do Poder judiciário no cenário político recente.

Em primeiro lugar importa observar que a ofensiva contra a corrupção política desencadeada pelo juizado federal no Paraná cria a novidade de um juiz de primeira instância assumir caráter nacional.

Em segundo lugar, a ação do juiz Sergio Moro, respaldada pelo Supremo tribunal Federal, correu o risco de “perder o foco” e ameaçar a governabilidade do Estado burguês no país, dado o caráter sistêmico da corrupção.  Não por acaso a Operação Zelotes contra as propinas bilionárias de pelo menos 70 empresas (como a Siderúrgica Gerdau, a Rede Globo e o Banco Itaú) aos integrantes do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda com o intuito de fraudar o pagamento de impostos devidos à Receita Federal, está em segundo plano. Na medida em que “mantém o foco” contra a coligação PT-PMDB, deixando de lado o PSDB (como o arquivamento da acusação contra Antônio Anastasia deixa claro), a Operação lava-Jato conferiu ao poder judiciário, no limite do agravamento da crise econômica, o papel de uma máquina de desarticular politicamente o governo Dilma-Temer.

O processo, como vimos, chegou ao limite político da assim chamada “governabilidade” (quer dizer, da estabilidade política para o bom andamento dos negócios).

Em terceiro lugar, pode-se afirmar que a ação do poder judiciário, independentemente da base material das acusações contra os políticos envolvidos na Operação Lava-jato, deixa patente que a democracia burguesa tem seus processos representativos (eleições) e de direitos individuais – quer dizer, de criação de consenso ou de legitimação que encobrem o caráter de classe da dominação burguesa – enfraquecidos no curto prazo.

A suspensão das garantias dos direitos individuais, o bloqueio ao habeas-corpus e o prolongamento das prisões preventivas, o uso da delação premiada significam a prevalência cada vez maior dos mecanismos de coerção, destacando, pois, a face ditatorial subjacente a toda democracia burguesa.

A comprovação, verdadeira ou não, de que os recursos da corrupção e empreiteiras foram transferidos para a campanha da coalizão PT-PMDB de 2014 e que, foi, portanto, fraudada ou a irresponsabilidade fiscal do governo naquele ano tende, porém, a conferir ao poder judiciário o papel de “salvaguarda constitucional da democracia”. Sob esse manto ou véu de defesa do interesse público a atuação do Poder judiciário oculta, por sua vez, a dominação de classe da burguesia.

Mas não se pode esquecer que foi este mesmo governo que entregou a corda para enforcá-lo ao sancionar a chamada “Lei contra as organizações criminosas” (Lei n. 12.850, de 2 de agosto de 2013), utilizada naquele momento contra os protestos sociais nas ruas das grandes cidades do país. Com esta lei, a presidente Dilma Roussef e o PT concederam legalmente ao poder judiciário o instrumento da colaboração (delação) premiada e do perdão judicial para pressionar os acusados a reconhecer crimes. Passou-se ao largo do pressuposto do direito burguês, como disse um advogado, de que a delação “não pode servir de pressão sobre o delator, pois viola o direito constitucional do cidadão em não ser obrigado a fazer prova contra si mesmo”.

O governo Dilma e o PT pensam sobreviver politicamente fazendo concessões à direita, como atesta a defesa do projeto de lei contra o terrorismo ora em tramitação do Senado Federal. O que justifica uma legislação com esse objetivo se o terrorismo não é de fato um problema no Brasil? Difícil não pensar que o critério da exceção para “as manifestações políticas, movimentos sociais ou sindicais” tem a motivação de conferir mais poder para quebrar as ações coletivas e limitá-las aos marcos legais vigentes. Lembremos que nas manifestações ocorridas em 2013 juízes impuseram proibições às marchas em rodovias promovidas por sindicatos e movimentos sociais em nome da liberdade de ir e vir dos motoristas e passageiros de veículos, contrapondo direitos sociais a direitos individuais. Uma vez aprovada tal legislação, portanto, a justiça burguesa terá mais um instrumento abrangente no seu arsenal repressivo contra os trabalhadores.

 

Operação Lava-Jato acelera a privatização da Petrobrás e a internacionalização da economia

Grupos de apoio do governo Dilma circularam a informação de que a Operação Lava-Jato teve um peso importante na crise econômica. Argumentam que a participação da Petrobrás e da cadeia industrial de petróleo e gás na economia representa algo em torno de 10% do PIB.

Essa participação é verdadeira, mas induzir daí efeitos contundentes na dimensão da crise econômica ignora o fato de que a Petrobrás vinha com um balanço de lucratividade em declínio decorrente da queda do preço internacional do petróleo (de mais de 60% entre 2014 e 2015) forçado pela Arábia Saudita e emirados árabes para se contrapor e inviabilizar economicamente o gás de xisto nos EUA. Esta queda contínua precipitou o corte nos investimentos em andamento nos estados de Pernambuco, Ceará e Rio de Janeiro e inviabilizou os investimentos no pré-sal, favorecendo a abertura de um novo ciclo de internacionalização da economia brasileira. Esta nova onda será baseada no ingresso de investimento estrangeiro direto em campos petrolíferos e na aquisição da BR Distribuidora, Transpetro e Gaspetro. Projeto de lei de José Serra (PSDB), aliás, retira a obrigatoriedade da Petrobrás ser a operadora única nos campos de pré-sal e de ter no mínimo 30% de participação na exploração destes campos.

Entretanto, se a quebra dos contratos da Petrobrás com as grande empreiteiras pode ter contribuído para ampliar a recessão econômica em marcha, com demissões de pessoal terceirizado vinculada à estatal, importa perceber os efeitos da Operação Lava-Jato sobre o processo de reconcentração do capital em favor das grandes empresas estrangeiras. Ou seja, o aprofundamento da integração da economia brasileira no sistema imperialista.

Uma ilustração nesse sentido é o caso da OAS, conglomerado multinacional de capital privado com interesses na área de engenharia e infra-estrutura, sediado no Brasil. Os grandes acionistas de capital nacional são as famílias Mata Pires e Pinheiro Filho.

A OAS detém 24,44% do consórcio Invepar – consórcio de 12 empresas que, constituído há 15 anos entre a OAS e a Previ, atua nas concessões de serviços públicos como o Metrô Rio de Janeiro e o Aeroporto Internacional de Guarulhos. Na estrutura das empresas controladas pelo consórcio destaca-se a participação acionária da Odebrecht.

A participação acionária da Invepar está assim composta, percentualmente:

 

OAS Infraestrutura S.A. 24,44%
Construtora OAS S.A. 0,0%
BB Fundo de Investimentos em Ações 25,26%
PETROS 25,0%
FUNCEF 25,0%

Fonte: http://ri.invepar.com.br/invepar/web/conteudo_pt.asp?idioma=0&conta=28&tipo=44503

A venda de 24,5% da OAS na INVEPAR, uma das maiores holdings detentora de operações no setor de infraestrutura e “o ativo de maior valor no segmento” que faz parte da recuperação judicial da empresa em crise desde a Operação Lava-Jato, com dívidas na ordem de 9 bilhões de reais, foi questionada pelos bancos credores como uma negociata entre a OS e a canadense Brookfield.

Na mesma direção de maior internacionalização da economia deve ser entendido o aumento da taxa de juros de longo prazo do BNDES, por se tratar de uma forma de subsidiar ou de garantir a reserva de mercado para grandes empresas predominantemente nacionais, a exemplo das empreiteiras. O papel do banco de desenvolvimento está sob questão também porque sofrerá, em decorrência da necessidade de reduzir o déficit fiscal, limitação do repasse de recursos do Tesouro Nacional.

 

A propósito da crise econômica

Afirmamos, no início desta Análise, que a crise política foi potencializada por uma crise econômica.

Quais são os dados que indicam a crise econômica?

De acordo com o IBGE o Produto Interno Bruto (PIB) recuou 1,9% em relação ao primeiro trimestre de 2015. Os indicadores são mais negativos na indústria (-4,3%) e na agropecuária (2,7%) em relação aos serviços (-0,7%). A formação bruta de capital fixo ou taxa de investimento recuou 8,1%. O quadro fica mais grave se a comparação é feita com o trimestre do ano anterior, quando a taxa de crescimento negativa do PIB vai para 2,6% ou acumulado em 12 meses para 2,1%.

Indica-se um quadro recessivo, pois o conjunto das atividades tem redução do crescimento por mais de um semestre consecutivo.

Eis os dados do IBGE:

Principais resultados do PIB do 4º trimestre de 2013 ao 2º trimestre de 2015

PIB

2013

2014

2015

4º tri

1º tri

2º tri

3º tri

4º tri

1º tri

2º tri

Trimestre / trimestre imediatamente
anterior
 (c/ ajuste sazonal)

-0,2

0,7

-1,1

0,1

0,0

-0,7

-1,9

Trimestre / mesmo trimestre do ano
anterior
 (s/ ajuste sazonal)

2,1

2,7

-1,2

-0,6

-0,2

-1,6

-2,6

Acum. em 4 tri / 4 tri imediatamente
anteriores (s/ ajuste sazonal)

2,7

2,8

1,5

0,7

0,1

-0,9

-1,2

Acumulado no ano / mesmo período
do ano anterior (s/ ajuste sazonal)

2,7

2,7

0,7

0,3

0,1

-1,6

-2,1

Fonte: IBGE Sala de imprensa
http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias?view=noticia&id=1&busca=1&idnoticia=2973

Na indústria, a maior queda ocorreu na construção civil, com retração de 8,4%. A indústria de transformação registrou queda de 3,7%.

Quando falamos em queda da atividade econômica por um período superior a um semestre (recessão) queremos dizer que a taxa de lucro declinou e que os capitalistas reduzem ou até suspendem o investimento da mais-valia em novo ciclo de acumulação de capital. O indicador da recessão é a redução da formação bruta de capital fixo ou taxa de investimento que, como noticiado pelo IBGE, recuou 8,1%.   É importante, contudo, chamar atenção para o fato de que, com o rebaixamento e a redução do poder de compra dos salários provocados pelas demissões, pelo elevado desemprego e pela inflação, a retomada da taxa de lucro se dará em patamares mais elevados favorecendo, no médio prazo (um a dois anos), a retomada dos investimentos e, logo, do crescimento da economia.

Cabe um breve comentário sobre o ajuste fiscal nesse quadro recessivo. O ajuste fiscal feito em benefício do capital financeiro representa o corte do gasto público de caráter social. Além das restrições ao seguro-desemprego e ao abono salarial, destaque-se, de um lado, a redução e o contingenciamento do orçamento público, comprometendo os gastos com educação e saúde públicas em todo o país; no que diz respeito à situação de saúde, tais cortes impõem um aumento do índice de doenças crônicas e do risco da mortalidade evitável, agravando o sofrimento da população trabalhadora.

De outro, o governo federal suprimiu os reajustes salariais dos servidores públicos federais devidos à inflação dos últimos três anos, substituindo-os por um aumento de 21,4% parcelados em quatro anos a partir de 2016, “tesourando” o 2º semestre de 2015. Tal posição conduziu a uma paralisação nacional do serviço público ainda em curso.

 

A situação das classes trabalhadoras

A situação das classes trabalhadoras e da classe operária em particular é de defensiva, no sentido agora mais crítico da perda do poder de barganha nas negociações com os patrões em decorrência da recessão econômica. A taxa de desemprego está em 8,2% (julho 2015), com 1.300.000 demitidos a mais em 2015, dos quais 750.000 com carteira assinada.

O quadro tende a se agravar. Agências de consultoria econômica preveem que entre 200 e 250 mil trabalhadores percam seus empregos apenas em São Paulo e mais de 1 milhão no país.

Nesse contexto, as principais centrais sindicais têm atuado para quebrar a capacidade de resistência dos trabalhadores que se encontram nas suas bases.  No caso da CUT privilegiou sempre os acordos com os patrões e agora apoia-se no Programa de Proteção ao Emprego (PPE) mediante o qual se negocia a manutenção de empregos em troca do rebaixamento dos salários. O estudo “Entenda o plano de proteção ao emprego, lançado por Dilma” publicado na Folha de São Paulo mostra que a redução da jornada de trabalho, se adotada pelas empresas, reduziria as despesas com seguro-desemprego mas que o trabalhador que ganha salários mais altos perderia mais.

A adesão ao PPE não tomou vulto ainda. Tudo indica que as empresas não adotaram maciçamente o programa porque não percebem possibilidade de recuperação econômica a curto prazo e, portanto, preferem demitir seus empregados mas também porque encontraram resistência por parte dos trabalhadores.

O sindicato dos metalúrgicos do ABC tem se empenhado em forçar a sua base a aceitar o PPE, ainda mais agora que se tornou Medida Provisória nº 680, de 6 de julho de 2015.

Entretanto, a proposta do sindicato dos metalúrgicos do ABC de negociar a implantação do PPE foi maciçamente rejeitada (60%) pelos operários da Mercedes Benz em votação secreta em urnas nas seções no inicio de julho; a recusa se deu pelo fato de que a aplicação da proposta implicaria em aumentar a exploração dos trabalhadores mediante a redução salarial. A empresa também queria demitir aposentados e trabalhadores com estabilidade, muitos dos quais são “compatíveis”, assim chamados pelos operários por exercerem função compatível com limitações decorrentes de lesões decorrentes do trabalho. Em decorrência da rejeição, a empresa iniciou a demissão de 1.500 empregados. A resposta dos operários foi uma paralisação que, deflagrada em 24 de agosto, durou sete dias. O acordo negociado pelo sindicato com a empresa reverteu as demissões mas implantou o PPE com corte nos salários de 10% e retomou a aplicação, para 2016, de apenas a metade do reajuste salarial.

Em contrapartida, a resistência dos trabalhadores ao PPE evidenciou-se em Ipatinga, na Usiminas, uma das bases da Intersindical – instrumento de organização e luta da classe trabalhadora. A empresa, em alegando perdas de encomendas, desligou um dos altos fornos e tentou convocar uma assembleia para discutir sua proposta de rebaixamento salarial. O sindicato mobilizou-se contra a manobra patronal e conseguiu apoio da justiça que negou a legalidade da convocação. Após a mobilização que envolveu toda a cidade de Ipatinga, venceu de 2.000 a 1.000 votos a posição de “aguentar o tranco” contra a empresa.

Em São José dos Campos, na base da Conlutas, demissões levaram à paralisação da General Motors.

Todos esses fatos comprovam que mesmo numa situação geral de defensiva é possível resistir ao aumento da exploração capitalista e não seguir o sindicalismo patronal no seu derrotismo frente às atuais condições de luta.

O enfraquecimento da CUT e da Força Sindical nas bases ainda não significa o surgimento de uma alternativa de classe junto a essas bases. Esse sindicalismo patronal cuida de transformar as fábricas e o acesso aos filiados como um feudo controlado, se for o caso, por bate-paus e, via de regra, com a entrega do nome de “revoltados” ao setor de pessoal para demissão.

Mas a própria força de penetração dessas duas centrais que historicamente controlam o movimento sindical tem diminuindo ao longo dos últimos anos. Estudo de Andréia Galvão deixa evidente esse enfraquecimento:

Índice de representatividade das centrais sindicais

Central 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
CUT 35,84 36,79 39,23 39,32 36,65 35,59 33,67
FS 12,33 13,10 13,71 14,12 13,67 13,82 12,33
UGT 6,29 7,19 7,19 7,89 11,25 11,21 11,67
CTB 5,09 6,12 7,55 7,77 9,15 9,18 9,13
NCST 6,27 5,47 6,69 7,04 8,09 8,08 7,84
CGTB 5,02 5,02 5,04 7,02 3,82 2,98 2,79
CONLUTAS         1,67 2,35 2,50
CSB             7,43

Fonte: MTE, 2015.

O pluralismo sindical na cúpula coexiste com a fragmentação das bases sindicais, ou seja, com a criação de novos sindicatos a partir da cisão de categorias econômicas favorecidas inclusive pela terceirização das atividades, o que demonstra que ser contra a terceirização nesse meio é via de regra apenas um discurso para engambelar os trabalhadores. Pois o que as centrais sindicais disputam não é a organização dos trabalhadores nas bases, mas a contribuição sindical, nome atual do antigo imposto sindical que continua a ser cobrado compulsoriamente aos trabalhadores por meio do desconto nas folhas de pagamento das empresas repassado ao Ministério do Trabalho e Emprego.

O total da arrecadação da contribuição (imposto sindical) em 2014 foi de 3,188 bilhões. Em 2015, o valor subiu para 3,5 bilhões. A distribuição desse valor se faz de modo percentual em 10% para o Governo Federal (Ministério do Trabalho e Emprego), 10% para as centrais sindicais, 5% para as confederações nacionais, 15% para as federações e 60% para os sindicatos, sustentando uma máquina  sindical enorme que sustenta pelegos que se eternizam nas direções das entidades e via de regra funciona contra a mobilização dos trabalhadores.

De acordo com o jornal O Globo de 20/07/2015 em 2014, a distribuição da contribuição (imposto) sindical do MTE para as centrais sindicais, no percentual proporcional ao número de sindicatos filiados, é a seguinte:

CUT – R$ 55,3 milhões

Força Sindical – R$ 46,2 milhões

UGT – R$ 38,1 milhões

NOVA CENTRAL – R$ 22,1 milhões

CTB – R$ 11,5 milhões

Central Sindical Brasileira – (?)

O valor de 173,2 milhões corresponde a 5,65% da contribuição sindical cobradas dos trabalhadores que foram repassados às cinco centrais sindicais, mas deixa de lado a sexta, a Central Sindical Brasileira, igualmente reconhecida pelo governo.

 

Perspectivas

A situação de defensiva do movimento operário – pressionado pelo desemprego e limitado em sua capacidade de luta pelo sindicalismo patronal e o peleguismo – permite que a burguesia resolva a crise nos seus próprios termos, contando com as forças políticas que defendem o status quo.

No início de setembro a relativa estabilidade política alcançada foi novamente posta em questão. De um lado, o governo Dilma apresentou ao Congresso uma proposta orçamentária com previsão de déficit de 30 bilhões e a busca de recursos para cobri-lo por aumento das receitas e não das despesas. Nesta proposta, o ministro Levy foi voto vencido por Nelson Barbosa e Mercadante, componentes da junta orçamentária do governo Dilma. Face a essa derrota, Levy cogitou em sair do governo.

Por outro, a notícia da saída de Levy coincide com a recusa da do PMDB de aceitar os termos da reforma administrativa e principalmente a redistribuição de cargos no segundo escalão, com vistas a usar a máquina do Estado para exercer influência nas eleições municipais de 2016. Declaração sobre a impopularidade do governo Dilma formulada pelo fiador político do governo junto ao PMDB, Michel Temer, voltou a colocar em cena a ameaça do impeachment, desta vez como manobra de chantagem da própria base aliada.

A crise política foi mais uma vez adiada, com a permanência de Joaquim Levy no Ministério da Fazenda, dada a advertência dos representantes do grande capital a Dilma, e a confirmação da linha geral do ajuste fiscal. Adiada, mas não resolvida, pois tanto o caminho a ser seguido como o peso do PMDB no governo ainda estão indefinidos. Tal como na metáfora, a situação política assemelha-se ao mar que se move sem sair do lugar em meio a ondas revoltas capazes de virar o barco.

Somente a intervenção de um movimento operário independente e oposto à burguesia poderá redefinir as relações de forças na sociedade brasileira em seu conjunto.

 

 Centro de Estudos Victor Meyer, setembro de 2015.

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