A bancarrota das concepções ultra esquerdistas sobre a crise do capitalismo

E.B.

 

Nota do CVM: Este artigo foi originalmente publicado no jornal Gegen den Strom (Contra a Corrente) da Oposição ao Partido Comunista Alemão (KPA-O) e traduzido pelo coletivo Marxismo Militante – Exterior, n. 3, abril 1977,  págs. 69-76.

 

As derrotas do PCA em 13 de março, em 10 e 24 de abril (1) iluminam repentinamente a situação fatal em que o Partido Comunista se encontra, pois o inimigo mais perigoso da classe operária, o fascismo, avança de vitória em vitória e realiza os últimos preparativos para a tomada do poder. Há tempo não é mais segredo que o Partido Comunista, devido à sua incorreta política ultra esquerdista, não é mais o bastião revolucionário, como a burocracia partidária o pretende e que há anos não possui mais nenhuma influência digna de menção nas fábricas e nas grandes organizações de massa da classe operária. Esta fraqueza do PCA, decisiva e real, foi, porém, escondida pelo fato de que desde o início da crise novas massas de membros afluíam ao Partido e que desde então pode também obter sucessos parlamentares. Esta fachada brilhante escondeu anos a fio a pobreza e a miséria da linha ultra esquerdista. Agora nas eleições das últimas semanas, esta fachada desmoronou e por trás dos destroços a classe operária não vê nada – a não ser vacuidade e vazio. Uma visão deveras alarmante! O inimigo em marcha – e o único partido, sob cuja liderança a classe operária pode rebatê-lo, [N.E: está] enfraquecido, confuso, vacilante em suas fileiras.

Esta situação ameaçadora tem que obrigar os membros do PCA à reflexão, à pesquisa das causas que levaram o Partido à sua iminente derrocada. Esta reflexão crítica começou para alguns, para os operários politicamente mais esclarecidos. Se o avanço do fascismo, as derrotas do Partido não conseguiram assustar a burocracia soberana em sua calma olímpica, a insatisfação dos membros, a dúvida crescente destes acerca da justeza da linha política, a acessibilidade destes aos argumentos do PCA-O (2) a tornam cada vez mais intranquila. Por isto ela empreende os mais desesperados esforços para salvar o mais sagrado dos bens – a infalibilidade da direção ultra esquerdista e a confiança cega em suas resoluções. Mas a continuidade da existência do Partido, a sua afirmação frente ao fascismo, depende exatamente de que a crença fetichista na política e na direção ultra esquerdista seja destruída radicalmente e que os membros consigam no último momento forçar uma mudança de diretrizes. A manobra da burocracia partidária de encobrir a própria bancarrota com a “autocritica bolchevista”, ou seja, com a crítica aos operários comunistas é infelizmente favorecida pelo fato de que uma grande parte dos membros, há pouco tempo no Partido, sem formação política e sem experiência, não conhece o desenvolvimento do PCA, nem da política e da tática comunista e antes de tudo não tem a mínima ideia da história da política ultra esquerdista e de seus erros. O que isto significa no atual momento vê-se imediatamente, se se leva em conta dois fatos: que o destino do PCA e da classe operária alemã durante muitos anos dependerá da liquidação da política ultra esquerdista e da sua substituição por uma política comunista de frente única, e que esta mudança de diretriz não virá de cima, pelo contrário, só poderá ser conquistada pelas bases contra a vontade da liderança a ultra esquerdista. O operário comunista, o simples membro do Partido tem em suas mãos a chave que pode abrir os portões para os amplos campos de uma política comunista plena de sucessos. Esclarecer este operário, ligar o ensinamento dos fatos com a crítica da linha ultra esquerdista expondo as necessidades políticas destes dias e semanas – esta é a tarefa mais importante do PCA-O no momento. Do cumprimento desta tarefa – liderar os membros comunistas na rebelião contra a burocracia ultra esquerdista incapaz – dependerá se o mundo viverá ou não um segundo drama finlandês, desta vez em território alemão.

O operário comunista organizado no PCA, seja apenas desde alguns meses, ou no melhor dos casos há uns dois anos, não sabe que a política ultra esquerdista desenvolvida pelo Partido desde o 6o Congresso da Internacional, significa uma ruptura total com os ensinamentos táticos que o Comintern desenvolveu sob a direção de Lenin, e que estão protocolados nas Resoluções dos primeiros quatro Congressos da Internacional. Quando a Internacional Comunista determinou a tática para os partidos comunistas nos países capitalistas, partiu das experiências dos anos revolucionários na Europa Ocidental. Essas experiências mostraram que os partidos comunistas não podem esperar ganhar as massas para si somente no fogo da revolução, pelo contrário, mostraram que a revolução proletária só poderia vencer se os comunistas conseguissem em período pré-revolucionário, por um trabalho tenaz, superar a influência do reformismo sobre a classe operária e conquistar as camadas decisivas do proletariado para as ideias do comunismo. Partindo desta compreensão histórica, o 2o, e especialmente, o 3o Congresso da Internacional Comunista, determinaram detalhadamente a tática dos partidos comunistas até o momento da tomada do poder. Trabalho nos sindicatos, tática de frente única, luta pelos interesses diários dos trabalhadores em ligação com a propaganda dos objetivos finais comunistas e com as palavras de ordem de transição – eram as linhas mestras da tática que deveria impedir que no caso de uma segunda onda revolucionária os partidos comunistas se encontrassem tão desarmados como os recém-fundados partidos nos anos 1918/20. Este importante legado de Lenin aos partidos comunistas nos estados capitalistas foi levianamente abandonado pela Internacional Comunista e pelo PCA com o início da era ultra esquerdista. Os resultados de uma de uma experiência de vários anos, de uma cuidadosa análise marxista, o trabalho dos mais significativos líderes da Internacional Comunista foram postos de lado sem maiores reflexões. Com as observações levianas de Losowski, no 6o Congresso da Internacional – de que as tarefas de uma Internacional não consistiam em repetir sempre as mesmas coisas a cada um de seus congressos – as resoluções dos quatro primeiros congressos da Internacional, que na concepção de Lenin teriam validade até a vitória da revolução proletária, foram engavetadas. E com isto foi aberto o caminho para a política ultra esquerdista a qual está em contradição direta com os ensinamentos de Lenin, e cujo resultado é a tragédia atual do movimento comunista nos países não russos.

O ponto de partida para a tática ultra esquerdista que foi introduzida pelo 6o Congresso foi a análise da situação do capitalismo durante este congresso. Para o marxista é indispensável a análise da situação objetiva, pois toda politica comunista se orienta nas condições econômicas e políticas e nas possibilidades para a realização dos objetivos comunistas que delas resultam. Toda análise falsa conduz por isso a erros no trabalho político do partido comunista. Uma análise errada pode resultar de dois procedimentos incorretos. De um lado da limitação da pesquisa às manifestações da superfície da vida social – é o típico procedimento do reformismo. Por outro lado, pode surgir da própria fantasia, dos próprios desejos e esperanças em relação à situação real que substituem o instrumento da pesquisa, o materialismo dialético – e esta caracteriza o “radicalismo”, a doença infantil do comunismo. A análise econômica do 6o Congresso – resumida no chavão do “terceiro período” padece essencialmente do último erro, mesmo que deva o seu surgimento inicialmente ao primeiro. Bukharin, que na sua exposição foi inicialmente o primeiro a falar do “terceiro período”, o definiu como o estágio da estabilização consolidada do capitalismo. Este equívoco oportunista não foi corrigido por uma análise precisa que constatasse as contradições do capitalismo estabilizado, que anunciasse os abalos vindouros do sistema capitalista, mas pelo contrário, pela sua substituição pelo equívoco inverso. No decurso do Congresso, e especialmente, nos dois anos seguintes, até o fim pouco honroso desta teoria, o 3o período da estabilização consolidada, tal como Bukharin o tinha definido, se transformou no da estabilização ultra podre, vacilante e abalada.

Os partidários da tática ultra esquerdista frequentemente defendem em discussões a posição de que a teoria do 3º período seria absolutamente correta, que a crise econômica mundial a teria confirmado e que a crítica feita pela Oposição Comunista a esta teoria se teria demonstrado falha. Estes companheiros passam por cima de duas questões. Primeiro, a teoria do 3o período não foi apresentada como uma profecia, ou seja, o terceiro período de estabilização abalada não deveria começar no futuro, pelo contrário, datava já a partir do ano de 1928. A crise, porém, só começou cerca de dois anos depois. O erro indesculpável de, num momento em que uma conjuntura de expansão ainda dominava na maior parte dos países capitalistas, decretar o imediato colapso do capitalismo, só pôde ser cometido porque se renunciara a qualquer exame econômico preciso – e foi em cima do mesmo material empírico da tese de Bukharin sobre a estabilização consolidada que se baseavam depois os defensores da afirmação de que o sistema capitalista estaria abalado. Só assim também foi possível proclamar o começo do 3o período de maneira igual para todos aos países com exceção da União Soviética, e com isto não dar atenção à lei do desenvolvimento desigual do capitalismo. Em segundo lugar os defensores do 3o período se esquecem dos erros cardiais desta teoria. O 3o período deveria não só significar o abalo econômico do capitalismo, mas também o colapso político da sociedade capitalista. Em incontáveis discursos, resoluções e artigos foi declarado que o 3o período seria sinônimo do avanço revolucionário, que o aguçamento das contradições do capitalismo conduziriam as massas para o lado do comunismo, que o Partido teria uma “breve, inflamada perspectiva” e que deveria se preparar para o “grande quebra-pau”. No decorrer do ano de 1929 a “imediata situação revolucionária”, que amadurecia se transformou em dito proverbial.

Com esta concepção os teóricos do 3o período abandonavam a compreensão marxista da relação dialética entre economia e política em favor de um ponto de vista mecanicista, economicista. Qualquer marxista sabe que o capitalismo não leva automaticamente o proletariado à consciência de classe, ao pensamento socialista e à ação revolucionária, que o desenvolvimento econômico por si só não leva de forma alguma as massas “à consciência da necessidade de derrubar o capitalismo e de realizar a revolução proletária”. Isso só pode ser atingido pelo trabalho de educação política consciente dos partidos socialistas, ou retrospectivamente hoje, dos partidos comunistas, os quais, baseados nos fatos do processo social trazem para a classe operária a consciência da sua tarefa de coveira da sociedade capitalista.

Este importante papel do partido comunista é, porém totalmente esquecido pela teoria do 3o período. E isto por uma liderança partidária para a qual transformou-se num esporte dirigir campanhas sucessivas, cada vez mais violentas contra o “luxemburguismo”, contra a superestimação da espontaneidade das massas e contra a subestimação do significado do Partido. Na realidade, uma crise capitalista, desacompanhada de um trabalho incansável, de uma tática coroada de êxito, de uma máxima atividade do Partido Comunista não traz de forma alguma o fortalecimento do fator revolucionário. É o que o presente momento ensina. O resultado mecânico da crise, por mais grave que ela seja não é o “grande quebra-pau”, o colapso automático do capitalismo. Existe não apenas uma saída socialista, mas também, uma saída capitalista da crise, não apenas uma revolucionária, mas também uma solução contra revolucionária da crise. Se o Partido Comunista não desenvolver com todas as suas forças uma política que lhe traga a confiança da classe operária, que leve os operários à consciência de que a saída revolucionária significa a única salvação possível para eles, as massas – e em primeiro lugar a pequena burguesia, mas diante de um fracasso contínuo do Partido, também camadas do proletariado – se dirigem para o campo da contra revolução, que lhes promete o fim das suas privações. Este “pormenor” foi esquecido pelos estrategistas do 3o período, que com isso se revelaram economistas vulgares e idólatras da espontaneidade das massas. Tal foi a análise econômica sobre cujos “seguros” fundamentos se baseou a nova tática ultra esquerdista das lutas ofensivas e decisivas das organizações sindicais próprias e da “frente única vermelha” e que devia representar a justificativa científica para o abandono da tática leninista.

A teoria do 3o período alcançou a idade de dois anos e então a crise econômica mundial que entrementes irrompeu lhe deu o tiro de misericórdia. Durante anos a fio os burocratas do Comintern se embriagaram com as frases sobre a estabilização abalada e a imediata e aguda situação revolucionária e já festejavam a vitória quando a crise chegou. Esta trouxe realmente um forte abalo econômico no sistema capitalista e com isto as condições objetivas para o ascenso revolucionário – fatos, que até então só existiram nas fantasias exuberante da liderança ultra esquerdista. Agora era a hora de mostrar que o Partido Comunista estava amadurecido para enfrentar as tarefas revolucionárias que se colocavam diante dele, de provar que possuía a confiança das massas, como o CC bravateava. Mas vejam só! Com o começo da crise, quando a prova dos nove deveria ser tirada a coragem dos audaciosos estrategistas do 3º período diminuía cada vez mais e os seus pronunciamentos se tornavam cada vez mais desalentados – até que a orgulhosa teoria do 3º período, que deveria trazer o fim da estabilização do capitalismo e a vitória da revolução, foi enterrada.

O irrompimento da crise pegou a liderança ultra esquerdista totalmente despreparada. Nos dois anos anteriores de política ultra esquerdista ela desaprendeu o uso do método dialético para a análise do desenvolvimento econômico, pois tomava a conjuntura de expansão como sendo crise. Quando a crise então realmente chegou, estava em consequência, totalmente incapaz de analisar em suas formas concretas de manifestação, da mesma maneira que não estava em condições de analisar a situação econômica nos anos 1928/1929. Até hoje está faltando um profundo tratamento e apresentação da crise econômica mundial na literatura comunista oficial. Onde se encontrar alguma ocupação com problemas sobre a crise, lá a concepção se aproximará com frequência da teoria mecanicista, grosseira de que não existiria nenhuma solução capitalista para a crise atual, a uma teoria, tal como a hoje representada pelo SAP (3), cuja consequência prática é a passividade da classe operária. A revista oficial do Comintern, “Die Kommunistische Internationale”, ainda em fevereiro deste ano, se queixou de que na imprensa partidária estava “fazendo falta um tratamento dialético desta questão (a crise econômica mundial)”. Não questiona porém a causa desta carência. Com o abandono do tratamento dialético da crise os redatores comunistas não fazem mais do que seguir galhardamente as pegadas dos profetas do 3o período. Também eles imaginam a possibilidade de um desmoronamento automático do capitalismo, como vimos. Assim, se bem que de outra perspectiva, continua a velha lenga-lenga. No lugar de se ocupar seriamente com a situação econômica na chamada terceira fase, os apologistas da teoria do 3o período lançam-se em especulações sobre as diferentes fases desta, que tanta seriedade tem como bolhas de sabão furta-cores das crianças. Hoje representam observações profundas mas completamente sem sentido sobre as etapas da crise, que na realidade são apenas etapas na capitulação impotente da linha ultra esquerdista diante das dificuldades de uma alternativa revolucionária à crise.

A primeira reunião do Comintern que se realizou depois do começo da crise, a reunião do Presidium Ampliado do Comitê Executivo da IC, em março de 1930, trouxe a primeira revisão da teoria do 3o Período. A crise tinha levado a um ataque sem precedentes do capital ao nível de vida das massas, a uma pressão contra revolucionária agudizada. De dominação capitalista abalada, de despreparo e impotência da burguesia, do destemido assalto do proletariado contra o sistema capitalista, já não se podia falar. Sob a violenta pressão destes fatos o CEIC se tornou mais modesto. E resolveu abandonar na questão a teoria do 3o Período, e em parte assumir a análise dos odiados “renegados” do PCA-O. Agora se dizia que o começo do abalo da estabilização chegara. O “ascenso revolucionário” porém foi mantido.

Esta primeira mudança de linha é cheia de ensinamentos para todas as seguintes. A direção ultra esquerdista, tendo em vista a realidade inexorável, se conformou em por de lado os exageros e as deformações mais grosseiras e a colocar, penosamente, pelo menos na aparência, a teoria em adequação à realidade. Porém, não conseguiu nem coragem nem compreensão – por medo de abalar sua autoridade e devido ao seu insuficiente conhecimento das condições – de criticar abertamente e revogar as resoluções que se tinha comprovado como falsas. Introduziu repentinamente na teoria do 3o período uma outra, no sentido acima comentado, e “esqueceu” generosamente o seu sentido e interpretação originários. Assim a “brilhante linha geral” – como Thälman costuma dizer – e a infalibilidade das instâncias superiores foram salvas.

Como, porém a origem dos erros do 3o período não foi descoberta, como a balela do ascenso revolucionário foi mantida, em pouco tempo os velhos disparates ressurgiram sob novas roupagens. É verdade que do 3o período não se falou mais; ele desapareceu – por estar muito comprometido – do vocabulário dos jornalistas do Partido. No entanto, como seu substituto, veio a “crise revolucionária”. Até o XI Pleno do CEIC a concepção de que a crise revolucionária era iminente, fazia parte das teorias fundamentais da linha ultra esquerdista. E extensos artigos nos jornais e revistas do Comintern e do PCA eram apresentadas reflexões sobre a “crise econômica”, a “crise política”, a “crise revolucionária”, a “situação revolucionária”, a “transformação da crise econômica em crise politica”. A essência destas posições era a velha teoria do 3o período: colapso do capitalismo ocorre automaticamente, através da agudização da crise econômica, que se transformam em crise política, no abalo político do domínio da burguesia, cuja resultante final é a crise revolucionária, a derrubada do capitalismo. A situação na Alemanha era caracterizada como aonde a crise econômica já tinha se transformado em política; em parte a crise revolucionária era esperada a curtíssimo prazo, e em parte, em artigos da “Die Internationale” era declarado que a situação revolucionária já teria chegado, pois todas as condições definidas por Lenin para revolução Proletária, já estariam preenchidas.

Naquela época o PCA-O chamou a atenção para o grosseiro despropósito implícito no jogo com os conceitos de crise política e crise revolucionária. Mostrou que para Lenin não existia nenhuma diferença entre crise política e crise revolucionária. Que, segundo a sua teoria, a crise revolucionária resoluta da crise econômica, se a classe operária sob a liderança do Partido Comunista investe contra a fortaleza capitalista, se não só as condições objetivas estão dadas, ou seja, o abalo econômico do sistema capitalista, mas também as subjetivas, a disposição de luta das massas. Declaramos dede então, que neste sentido a Alemanha até agora não atravessara nenhuma crise política revolucionária. Acentuamos na nossa crítica que há muito as condições revolucionárias objetivas estão preenchidas na Alemanha, mas que, por consequência da linha ultra esquerdista o fator subjetivo estava falhando; que as repetidas afirmações solenes de que a situação revolucionária já existiria, nada mais eram do que auto-engodo; e que as etapas do desenvolvimento revolucionário, descobertas com argúcia escolástica, só pretendiam esconder que o Partido, de etapa em etapa, naufragava na fraseologia ultra esquerdista e na passividade oportunista. Nossa crítica foi respondida com invectivas violentas. Nas instâncias partidárias se apressaram mais uma vez a confirmar que a Alemanha se encontrava às vésperas da revolução e que o fator revolucionário se desenvolvia passo a passo com o objetivo.

No entanto, a despeito das declamações, das frases e sonhos voluntaristas e ultra esquerdistas, a crise prosseguiu sua marcha, a miséria das massas aumentou, a ofensiva do capital se tornou mais impetuosa, a contra revolução mais forte – e onde existia o avanço revolucionário, a crise revolucionária e a  situação revolucionária na Alemanha permaneceu um segredo da liderança ultra esquerdista. Fora do Comintern e das instâncias partidárias, todo o mundo restante não percebia nada do aproximar-se da revolução proletária.

Finalmente, tendo em vista a situação real o Comintern viu-se obrigado no XI Pleno em março/abril de 1931, para proteger o movimento comunista da desgraça do ridículo, a desistir radicalmente do fantasma da já existente crise revolucionária. Com isto, foi finalmente proferida a sentença de morte à teoria do 3o período. A crítica do Pleno do CEIC coincide amplamente com a dos “renegados contra revolucionários”. Manuilski precisou constatar no seu discurso que não existe diferença entre crise política e crise revolucionária, que em nenhum país existia crise revolucionária, que o fator revolucionário permanecia atrás das condições objetivas, que na questão do caráter e velocidade do ascenso revolucionário erros crassos tinham sido cometidos, etc, etc. Porém da mesma forma que na reunião do CEIC do ano anterior, a liderança do Comintern se contentou em enumerar as falhas na teoria e na prática dos partidos comunistas. A questão do por quê não foi colocada. A razão do fracasso tão completo dos partidos comunistas diante de condições objetivas favoráveis para a revolução, não foi esclarecida. A discussão desta questão teria desmascarado a política ultra esquerdista da catástrofe e a bancarrota da linha ultra esquerdista a qual o Comintern ainda não tinha podido se decidira abandonar. Desta forma a mudança de rumo tinha de necessariamente permanecer pela metade, insuficiente.

O resultado do XI Pleno do CEIC foi que a fraseologia radical da situação revolucionária, da vitória da revolução que se aproximava, etc., se tornou mais rara na agitação do Partido Comunista. Como porém o XI Pleno do CEIC negligenciou afastar através de uma mudança de rumo, a relação equivocada entre o fator subjetivo e o objetivo e na medida que este equívoco ainda aumentou com o aprofundamento da crise, a consequência do abandono da fase radical só podia ser o outro extremo, o oportunismo, o derrotismo, o pânico.

Tomemos por exemplo o discurso que Thälmann pronunciou na Sessão Plenária do CC do PCA em fevereiro de 1932 e que foi divulgada como brochura com o titulo de “A alternativa revolucionária para a crise”. Thälmann necessita, de acordo com as orientações do XI Pleno do CEIC, de reconhecer o atraso do fator revolucionário. Quem é culpado disto? Não é o Partido que é o responsável, responde Thälmann, “se na Alemanha a revolução não venceu. Uma tal apresentação do ‘atraso’ iria dentro das circunstâncias fazer com que uma parte da classe operária, por causa das nossas explicações, tivesse abalada a sua confiança no Partido”. Assim, a linha política e as instâncias partidárias permanecem sem mácula. Mas, quem é então o responsável? A culpa – ficamos então sabendo – está nas condições objetivas. Como tais são arroladas: a ameaça do imperialismo francês de intervir, no caso de uma revolução alemã, além disso, o desânimo despertado pelo SPD, as “dificuldades complementares da crise”, o grande exército de desempregados que dificulta a greve. Isto é oportunismo da pior espécie. Todas estas dificuldades poderiam ser superadas no caso de uma política correta do Partido. Citá-las como desculpa para o fracasso da direção incapaz do Partido, não é senão capitulação diante destas dificuldades.

Se partimos desta concepção – de que as condições objetivas e não o Partido, são as culpadas de que nós na Alemanha não tivemos ainda uma revolução até o fim, chegaremos a aqueles comunistas que no 10 e 24 de abril se passaram para o campo do fascismo. São as condições objetivas ainda imaturas para a ação revolucionária do Partido Comunista, então ajudemo-las, então criemos através da vitória do fascismo a crise revolucionária – a crise revolucionária que até agora o Partido não pode trazer. São os “revolucionários impacientes” os que assim argumentam e agem. Porém, não menos impetuosamente do que este tipo de “impaciência revolucionária” alastra-se o derrotismo. O fracasso do Partido Comunista, a ofensiva da contra revolução, são cada vez mais aceitos como um destino inevitável. Autoridades no comunismo como o Pravda já se encontram no mais escandaloso derrotismo como o que foi representado no 6o Congresso da Internacional por um delegado. Este afirmava, supostamente baseado no “grande processo de raciocínio que nos foi legado por Marx e Engels, que o movimento operário só chegaria à vitória final através de uma sequência contínua de vitórias, mas que nós teríamos que caminhar através de uma série de derrotas”. Se estas ideias se transformarem no com senos dos membros do Partido, então seria impossível impedir a vitória do fascismo e a derrocada do Partido.

O caminho que vai da vitória certa – na análise econômica do 6o Congresso da Internacional – até a avaliação oportunista e derrotista da situação nestes últimos meses e semanas é longo. Mas a liderança ultra esquerdista conseguiu percorrê-lo em quase quatro anos. É uma queda sem igual. É verdade que existiram paradas, pausas curtas para pensar, vacilações, mas a força para uma mudança de rumo não foi conseguida. O atual ânimo capitulacionista nas instâncias partidárias ao lado de prementes condições favoráveis para o movimento comunista significa a pena de morte para a avaliação econômica da situação pela liderança ultra esquerdista e para a tática que nela se baseava. Tendo em vista esta circunstância o PCA-O precisa mostrar aos membros do Partido, através da análise marxista da atual situação, que não existe razão para pânico e capitulação se eles nos apoiarem contra o autores deste perigo, na luta contra a linha ultra esquerdista e seus defensores.

Notas:

(1) No decorrer do ano de 1932 registrou-se uma série de avanços eleitorais dos nacional-socialistas. No dia 13 de março, nas eleições presidenciais, conseguiram 30,1% dos votos. O PCA obteve 13,2%. Foi necessário um segundo escrutínio (que deu vitória a Hindenburg) no qual os nazistas conseguiram aumentar sua votação para 36,8%, enquanto a do PCA baixou para 10,2%.  No dia 24 de abril realizaram as eleições para as Assembleias Estaduais da Prússia, de Hamburg, Würtenberg e Anhalt. Os nazistas conseguiram aumentar a sua votação anterior (1928) de meio milhão de votos para 8 milhões.

(2) PCA-O (Partido Comunista da Alemanha – Oposição), fundado em 1928 contra o curso ultra esquerdista [do Partido Comunista Alemã e da Internacional Comunista], teve em sua direção Henirich Brandler e August Thalheimer, oriundos da Liga Espártaco, constituída no final da I Guerra Mundial. Na literatura também é conhecido por “Oposição Comunista Alemã” (KPD-O ou KP-O, em alemão).

(3) SAP – Socialistische Arbeiterpartei (Partido Operário Socialista). Partido centrista, que resultou de uma cisão de esquerda na social democracia alemã.

 

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