Movimentos de luta pela terra ocupam sedes do INCRA
A mobilização começou nesta segunda-feira, 12/05, na Bahia e em Sergipe, e segue até que as propostas sejam ouvidas pelos governos Estadual e Federal.
do Portal do Centro de Estudos e Ação Social – CEAS
Movimento dos Acampados e Assentados e Quilombolas da Bahia (CETA), Movimento dos Trabalhadores Desempregados (MTD), Pastoral Rural, Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Movimento de Luta pela Terra (MLT), Articulação Estadual de Fundos e Fechos de Pasto e Povos Indígenas ocuparam nesta segunda-feira, 12/05, a sede do INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, no Centro Administrativo da Bahia, em Salvador. Em Aracaju – SE, cerca de 1200 trabalhadores da Pastoral Rural ocupam também a sede do INCRA. A mobilização integra a jornada de luta dos movimentos para denunciar o descaso dos governos Estadual e Federal com a reforma agrária.
Mobilizados em torno da Jornada de Lutas 2014, os movimentos denunciam o cenário de desmantelamento da política de Reforma Agrária no Estado da Bahia e a completa ausência do executivo, legislativo e judiciário na defesa do direito das populações empobrecidas rurais, e a sua pesada atuação na defesa e ampliação das articulações do grande capital, com a entrega das terras para os fazendeiros e ao agronegócio, que expulsa as famílias e destrói a natureza; a paralisação da reforma agrária e da demarcação dos territórios tradicionais; a lentidão do judiciário para as imissões de posse em favor dos povos do campo e tradicionais.
Os movimentos repudiam a criminalização dos que lutam por terra, território e igualdade social e a apropriação ilegal das terras públicas (grilagem) pelas empresas do agronegócio, que invadem estas terras com o aval do Estado.
Diante desse cenário reivindicam:
- Que a REFORMA AGRÁRIA não seja confundida com a condição de Programa Brasil sem Miséria, mas seja vista como uma política pública de desenvolvimento social e que se contraponha ao modelo de inserção no capitalismo mundial levado a cabo pelo governo brasileiro. Para tanto, é necessário que o órgão responsável seja fortalecido e equipado humana e financeiramente.
- O reconhecimento e titulação dos territórios tradicionais de indígenas, quilombolas, fundos e fechos de pasto e demais comunidades tradicionais.
- O não desmantelamento das propostas populares de convivência com o semiárido e sim a ampliação das ações, a exemplo da mobilização popular para a construção de cisternas de placa e demais alternativas, de políticas públicas de assessoria técnica e educacional continuada.
Contexto das mobilizações
A face agrária brasileira é uma face de exclusão. Os movimentos sociais, os povos e comunidades tradicionais e as organizações populares sentem e carregam o peso dessa exclusão.
A concentração fundiária no Brasil se mantém a mesma desde, pelo menos, os anos 60, pois o índice de Gini (índice que mede a desigualdade social) se manteve no patamar de 0,86. Apenas 1,6% dos imóveis rurais concentram mais da metade do território nacional, segundo o INCRA.
A questão agrária brasileira e baiana expressa as contradições e limitações do capitalismo no campo. As contradições se manifestam em um discurso da iniciativa privada e do Estado que prometem inclusão de todos e, para tanto, forçam a orientação dos gastos públicos para garantir a infraestrutura necessária para a implantação e ampliação de empresas e apropriação privada da terra, da água, dos minérios e da natureza como um todo. As limitações são percebidas na exclusão dos trabalhadores e trabalhadoras rurais do acesso aos bens da natureza e, principalmente, à terra e à água, e ao desenvolvimento prometido.
A política de Reforma Agrária hoje sofre um duro golpe com a edição de portarias e instruções normativas que, em seu conjunto, tem como objetivo sepultar qualquer promessa de distribuição de terras no Brasil que leve em consideração a necessidade de trabalhadores e trabalhadoras. Por essas portarias e instruções normativas, a reforma agrária está se tornando cada vez mais inviável para a garantia da soberania alimentar e política dos camponeses.
O que configura o capital no campo é a crença em modelo de desenvolvimento assentado em grandes obras de infraestrutura, na monocultura e na extração de minérios, que continuam a beneficiar os já fartamente beneficiados. É nesse contexto que inserem obras como a transposição do Rio São Francisco, a Ferrovia de Integração Leste-Oeste, o Porto Sul em Ilhéus, o estaleiro naval na Baía do Iguape, as extensas áreas destinadas ao plantio de eucalipto, a exploração mineral em diversos territórios de identidade da Bahia, sobretudo a exploração de ferro, urânio etc. e, mais recentemente, os parques eólicos.
A titulação de territórios indígenas está ameaçada pela possibilidade de aprovação da Proposta de Emenda à Constituição n.º 215, que busca retirar o poder de demarcar territórios do Executivo e pretende transferi-lo para o Congresso Nacional, onde representantes ruralistas e outras organizações contrárias à reforma agrária e reconhecimento de territórios tradicionais se organizam para retirar direitos já consagrados e negar a dívida histórica e social com os povos indígenas e quilombolas.
No semiárido, a organização popular concebeu a ideia de convivência com o bioma caatinga e cerrado, desenvolvendo tecnologias para permanência das famílias camponesas na região, mesmo com longos períodos de estiagem. No entanto, o Estado tem tratado a questão da seca como um problema superficial e não tem formulado, ao longo dos anos, políticas sérias de tratamento da questão, ao contrário, tem fomentado a indústria da seca para beneficiar oligarquias locais e regionais, o que hoje pode ser percebido através da implantação de cisternas de plástico, em que o único beneficiado é a empresa de propriedade de Fernando Coelho, deputado federal.
Os fundos e fechos de pasto da Bahia, comunidades tradicionais que ocupam áreas abertas para a criação de animais à solta, enfrentam, além da seca, o avanço das cercas de fazendeiros e empresas sobre suas terras. Esses frequentemente utilizam o expediente da grilagem de terras e a violência armada e legalizada.
Apesar de todo esse cenário desanimador, os movimentos sociais e povos e comunidades tradicionais nos mantemos em luta, ocupando terra e órgãos públicos, fazendo retomadas, marchas, atos públicos, propondo novos caminhos e sugerindo políticas públicas estruturantes e necessárias à garantia de direitos e autonomia como organizações políticas da sociedade.