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Portugal 1974: Liquidação das conquistas democráticas

Neste 25 de abril em Portugal, há precisamente 49 anos, irrompia a Revolução dos Cravos que derrubou a ditadura de Salazar que vigorava  desde 1933. O CVM publica a análise de Ernesto Martins (Érico Sachs) sobre este momento histórico, que foi escrita originalmente para a Revista Marxismo Militante Nº 2 exterior em fevereiro de 1976.  (CVM)

 

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O Segundo Pacto, concluído entre militares e representantes dos partidos políticos, deverá marcar a volta de Portugal a um regime democrático-parlamentar burguês. Embora os militares resguardassem o direito de intervenção política nos próximos quatro anos, o princípio da divisão dos poderes e o acesso dos políticos ao governo foram garantidos pelo Pacto.

Estamos em plena fase de liquidação das conquistas revolucionárias do movimento desencadeado pelo 25 de Abril. O marco visível para o declínio do processo revolucionário foi o 25 de novembro do ano passado, a fracassada rebelião dos paraquedistas. Representou, entretanto, somente um marco externo, pois de outro modo não seria compreensível a relativamente fácil vitória da reação. Desde agosto, pelo menos, as forças revolucionárias e a esquerda em geral se encontram na defensiva. Apesar de ter havido contra-ataques e do movimento de polarização no seio da própria esquerda, todos os sucessos momentâneos, aparentes ou reais, não conseguiram anular a tendência geral da ofensiva das forças da direita.

Não pretendemos aqui reconstruir essa evolução em todos os seus detalhes. Nos limitaremos a destacar os seus pontos altos, que permitem uma compreensão melhor da situação atual e uma avaliação das perspectivas.

Em agosto de 1975, as ações terroristas no Centro e no Norte de Portugal, dirigidas contra o PC, sindicatos e outras forças de esquerda, tinham atingido o seu ponto culminante. Quase todas as sedes do partido tinham sido destruídas, mormente nas localidades menores. Ao norte de rio Tejo, o PC e organizações à esquerda dele tinham voltado a uma existência semiclandestina ou mesmo clandestina. Se os bandos terroristas diminuíram então as suas atividades ostensivas, isto se deu não só porque tinham cumprido as suas tarefas. No quadro de uma estratégia geral da ofensiva da direita, a iniciativa foi deixada então a cargo do grupo Melo Antunes no seio do MFA, o que em espaço de tempo relativamente curto levou a queda do Governo Gonçalves. leia mais

A contradição entre capital e trabalho se acentua na Alemanha

 

 

O artigo  As contradições crescem e a perspectiva “se as empresas vão bem, os assalariados vão bem” está desmoronando que reproduzimos abaixo foi traduzido de um texto para discussão publicada no site de Arbeiterpolitik (Política Operária), organização conhecida pela sigla ARPO. Existente desde 1947, foi uma iniciativa de camaradas oriundos do Partido Comunista da Alemanha–Oposição (KPO) e do Partido Socialista dos Trabalhadores da Alemanha (SAPD), na qual se destacaram os nomes de August Thalheimer e Heinrich Brandler.

A foto de abertura da postagem é uma imagem da paralisação dos metalúrgicos da siderurgia em Duisburg, no inverno de 1987, copiada do periódico Arbeiterstimme (ASTI) n. 206, de 2019/2020. Com sua divulgação, expressamos também a esperança e os desafios da retomada da luta operária na Alemanha, apontada no texto “As contradições crescem e a perspectiva ‘se as empresas vão bem, os assalariados vão bem’ está desmoronando”, e que pretendemos aprofundar em outra oportunidade. A matéria está acessível em língua alemã no portal Arbeiterpolitik , e também por ser baixado em formato pdf aqui.

 

As contradições crescem e a perspectiva “se as empresas vão bem, os assalariados vão bem” está desmoronando

Para discussão

1º de abril de 2023

Se hoje em todas as grandes cidades alemãs 2 milhões de pobres fazem fila no Tafel (banco de alimentos)para conseguir algo para comer, nem sempre foi assim. Até o colapso da União Soviética, a política da República Federal Alemã tinha como objetivo ser uma vitrine para o Oriente. O colapso da União Soviética, e com ela o fim da República Democrática Alemã (RDA), tornou esta política supérflua. Sem entrar nos detalhes do desenvolvimento econômico, a criação do segmento de baixos salários aparentemente pôs fim ao alto número de desempregados na década de 1990, mas jogou a situação de renda dos empregados de volta a um mínimo da reprodução da força de trabalho. Como resultado, o setor de baixos salários foi e está sendo expandido para todas as áreas de produção e reprodução. O resultado desse desenvolvimento – não apenas na Alemanha – é a distribuição cada vez mais desigual do produto do trabalho em favor dos já ricos sem detrimento de um número crescente de pobres.

O capitalismo ocidental saiu vitorioso da competição da Guerra Fria. Desta forma, o capital alemão teve a oportunidade de produzir a baixo custo, entre outras coisas, produtos preliminares para a produção industrial nos países do Leste Europeu, anteriormente controlados pela União Soviética, bem como na África e no Sul da Ásia. Ao fazer isso, melhorou sua posição na competição global. A organização estatal da economia “socialista” foi a perdedora.

Este desenvolvimento teve um impacto sobre a classe trabalhadora na Alemanha. O fracasso da União Soviética e, portanto, também da RDA fez o capitalismo parecer insuperável para as massas da população. Desta forma, o governo Schröder foi capaz de dar rédea solta à produção privada para esta se desenvolver.

As turbulências sociais na Alemanha oriental e os altos índices de desemprego, também característicos da situação mundial e a pressão do capital financeiro em ascensão, levaram a uma onda de privatizações de bens públicos em todo o mundo. leia mais

Futuro do presente: centralização sindical ou luta de classe?

 

Os trabalhadores – especialmente os operários – estão sendo chamados outra vez a sustentar a retomada do crescimento do capitalismo no Brasil, cujas alavancas se mantém, contudo, firmes nas mãos da classe dos capitalistas, da burguesia.

O apelo, feito pelo novo presidente da República, tem amplo apoio no movimento sindical. A voz audível agora é a dos dirigentes entrincheirados no Ministério do Trabalho e Emprego. Será este o futuro do presente? Acreditamos que não. Suportar a pressão pela produção em contexto de baixos salários, inflação persistente e carestia significa nada menos do que um novo aumento na taxa de exploração acrescentando o arrocho salarial.

Assim, examinar as manobras do Fórum das Centrais Sindicais e recusá-las significa apontar outro caminho, o caminho da luta de classe, enraizado nas experiências concretas.

 

A centralização sindical

Ao apoiar formalmente as eleição de Lula em abril de 2022 (Conclat) e, em seguida, ratificar o compromisso de sustentar o governo eleito na cerimônia oficial no Palácio do Planalto ocorrida em 18 de janeiro de 2023, os dirigentes do Fórum das centrais sindicais subscreveram uma espécie de carta de servidão dos trabalhadores ao capital. Naquele dia, ouviram Lula afirmar a necessidade dos trabalhadores apertarem os cintos, ao lembrar da sua prisão pela ditadura militar em 1980 quando, fazendo greve de fome, se contentou em comer pouco a pouco “quando sentia à vontade de comer um frango assado inteiro.” leia mais

Trabalhadores em greve na Europa: retomada da luta de classes

Reproduzimos a seguir alguns artigos publicados na imprensa europeia sobre as greves dos trabalhadores na França, Alemanha e Inglaterra. Com a inflação, o aumento do custo de vida e a consequente perda do poder aquisitivo dos salários, as classes trabalhadoras se mobilizam em manifestações de rua e greves gerais em protesto contra os patrões e seu governo.

Essas lutas possuem um caráter econômico, sem dúvida. Porém, rompem com o imobilismo e enfrentam a sanha capitalista de jogar a crise econômica nas costas da classe trabalhadora.

Na memória das gerações de operários há uma incontestável tradição de luta que pode vir a tona e fazer avançar a organização e a consciência de classe em oposição aos interesses da burguesia. Esse é o primeiro passo mas é um avanço fundamental para a classe  trabalhadora: divisar e enfrentar as classes exploradoras e não lhes dar sossego.     (CVM)

 

Maior greve em três décadas paralisa a Alemanha

Deutsche Welle 27/03/202327 de março de 2023

 

Trens, ônibus, aeronaves e embarcações não operam nesta segunda-feira, em pressão por aumento de salários. Entenda por que os sindicatos são tão fortes na Alemanha e seu grande poder de negociação

 

Boa parte da Alemanha está parada nesta segunda-feira (27/03): trens, ônibus, aviões e embarcações não estão operando, na maior greve do país em mais de 30 anos, com impactos em praticamente toda a sociedade alemã.

Dois dos mais importantes sindicatos da Alemanha, que juntos somam mais de dois milhões de membros – o Sindicato dos Ferroviários (EVG) e sindicato do setor público alemão(Verdi) – convocaram uma greve conjunta, planejada para coincidir com o início da terceira rodada de negociações salariais. Os sindicatos exigem aumentos de pelo menos 10,5%, devido à alta histórica na inflação alemã, que afeta diretamente os custos de vida. Nas outras rodadas, aumentos de 5% e pagamentos de bônus únicos foram rejeitados.

O tráfego de longa distância nas ferrovias está quase completamente interrompido, afetando também países vizinhos, visto que muitas linhas têm trajetos além das fronteiras alemãs. No tráfego regional, a maioria dos trens também não circula, de acordo com a companhia ferroviária alemã Deutsche Bahn (DB).

Todos os grandes aeroportos estão em greve, com exceção do de Berlim-Brandemburgo, que está operando voos internacionais, já que os domésticos não estão chegando nem partindo devido à paralisação nos outros aeroportos do país. Estima-se que 400 mil passageiros sejam afetados.

Além disso, em sete estados – Baden-Württemberg, Hesse, Baixa Saxônia, Renânia do Norte-Vestfália, Renânia-Palatinado, Saxônia e grandes partes da Baviera – ônibus urbanos, metrôs e bondes também estão parados.

O transporte de cargas, tanto na rede ferroviária quanto nos portos, também é atingido, pois os estivadores se juntaram aos grevistas. Consequentemente, entregas de mercadorias que seguiriam por barcos e trens também foram afetadas.

Outro reflexo da greve é a maior circulação de carros nas rodovias, devido aos transportes públicos e de longa distância parados.

O que pedem os sindicatos

Os dois grandes sindicatos estão em um impasse nas negociações com os empregadores do setor público federal e locais em vários setores de transporte – incluindo ferroviário, transporte público local e pessoal de terra em aeroportos.

Para pressionar um acordo, 350 mil trabalhadores de diferentes setores foram convocados a aderir a chamada “greve de advertência” nesta segunda-feira, que foi precedida por paralisações menores nas últimas semanas.

No caso do Verdi, uma nova rodada de negociações, ao lado da Federação Alemã de Funcionários Públicos e União Salarial (DBB), com representantes do governo federal e dos governos locais começa nesta segunda-feira em Potsdam para definir o destino dos salários de 2,4 milhões de pessoas. O sindicato exige 10,5% e pelo menos 500 euros a mais de salário por mês. Anteriormente, os empregadores oferecem um aumento salarial de 5% por um período de 27 meses e uma compensação 2,5 mil euros em um pagamento único, isento de impostos.

O EVG, por sua vez, recomeça no meio da semana negociações coletivas com a Deutsche Bahn e cerca de 50 outras empresas. Se não houver um acordo, o sindicato não descarta novas paralisações no feriado de Páscoa. O EVG pede aumentos salariais de 12% ao longo de um período de um ano, mas pelo menos 650 euros como “componente social”.

A Deutsche Bahn criticou a paralisação, que classificou como “exagerada”. “Milhões de passageiros que dependem de ônibus e trens estão sofrendo com essa greve excessiva e exagerada”, disse o porta-voz da Deutsche Bahn, Achim Strauss. “Nem todo mundo pode trabalhar remotamente”, acrescentou.

“Milhares de empresas que normalmente enviam ou recebem suas mercadorias por via férrea também vão sofrer”, disse, destacando que “o meio ambiente e o clima também sofrerão” e que os vencedores serão “as empresas petrolíferas”.

Por que os sindicatos são tão fortes na Alemanha?

Diferentemente do Brasil, a Alemanha adota, desde 1945, um modelo de unidade sindical. Além disso, a associação a um sindicato ocorre de forma espontânea, sem qualquer imposição normativa e sem qualquer restrição legal. No final de 2018, por exemplo, aproximadamente 7,8 milhões de pessoas pertenciam a um sindicato, de acordo com estudo da Fundação Friederich Ebert.

O nível de sindicalização na Alemanha é considerado alto, mas concentrado em um pequeno número de entidades, que, portanto, tem maior representatividade e, consequentemente, mais poder de negociação coletiva. O Verdi, por exemplo, reúne trabalhadores de mais de mil profissões e é o segundo maior do país em número de filiados.

Em outras palavras: enquanto no Brasil os sindicatos são mais numerosos e bastante segmentados por áreas e por regiões, na Alemanha são mais abrangentes, em menor número e com mais filiados. Assim, greves gerais como a desta segunda-feira se tornam possíveis, com um alto impacto em todo a sociedade.

O modelo de sindicato unitário foi adotado na Alemanha logo após o fim Segunda Guerra Mundial. De acordo com a Fundação Friederich Ebert, um dos motivos foi que a divisão política do movimento sindical foi considerada uma das causas de sua destruição quase sem resistência pelos nacional-socialistas em 1933.

Outro ponto fundamental é que não existem vínculos formais entre as centrais sindicais e os partidos políticos e nem repasses de verbas por parte das legendas aos sindicatos.

A contribuição sindical pode ser deduzida do imposto de renda, e os dias de greve não pagos pelos empregadores são ressarcidos pelos sindicatos aos trabalhadores.

Custos da greve

Apesar dos transtornos causados aos cidadãos, principalmente a dificuldade para chegar ao trabalho, especialistas financeiros avaliam que as consequências da greve desta segunda-feira na economia alemã são bastante limitadas.

“A megagreve é ​​um problema para os cidadãos e prejudica a reputação da Alemanha como um país de negócios”, disse o economista-chefe do Commerzbank, Jörg Kramer, em entrevista à agência de notícias Reuters. “Mas os impactos econômicos de uma greve de um dia são limitados, já que quase todas as empresas, exceto as diretamente afetadas, continuarão [trabalhando] normalmente”.

Os portos bloqueados, voos cancelados e linhas de trem paradas podem gerar prejuízos de até 181 milhões de euros, estima Klaus Wohlrabe, especialista do Instituto de Pesquisa Econômica (Ifo), da Alemanha.

le (Reuters, ots)

 

Grã-Bretanha: Onda de greve continua adiante no 15 de Março

Trabalhadores e trabalhadores em greve no Reino Unido voltam às ruas hoje em sua jornada de lutas.

SUSAN PRICE E TERRY CONWAY 15 MAR 2023, 14:37 – Revista Movimento

Via Green Left

Diante de um dia significativo de ação industrial em toda a Grã-Bretanha em 15 de março – Dia do Orçamento – Susan Price, da Green Left australiana, perguntou à integrante da Resistência Anticapitalista (A*CR) Terry Conway sobre o significado da onda de greve e o que será necessário para forçar o governo a tomar a mão.

Os professores estão em greve rolante de 28 de fevereiro em toda a Inglaterra, e até 100.000 sindicalistas de todo o setor público estão planejando uma ação industrial em 15 de março (Dia do Orçamento). O que os trabalhadores estão exigindo e quão significativa é esta onda de greve?

A greve vem ocorrendo intermitentemente desde junho passado: particularmente por trabalhadores ferroviários e de correio, professores universitários e universitários, funcionários públicos e, mais recentemente, em partes do serviço de saúde e escolas.

Os trilhos e o correio são, em sua maioria, privatizados – mas são lugares nos quais os governos têm mais impacto nas negociações do que em outras partes da economia. Uma ética de serviço público também é esperada tanto pelos trabalhadores quanto pelos usuários. Assim, embora o pagamento seja central, a prestação de serviços também é um problema. Assim, por exemplo, quando os patrões falam sobre a necessidade de aumentar a produtividade a fim de financiar um aumento de salário – não que eles estejam dispostos a dar muito terreno lá – os sindicatos respondem que os cortes de empregos ameaçam a saúde e a segurança e, em particular, os direitos de muitas pessoas deficientes que precisam de assistência para usar trens inacessíveis. Para os sindicatos de educação e saúde, estas questões são ainda mais centrais para as disputas – e para o nível de apoio público que elas atraem.

Os níveis de ação industrial na Grã-Bretanha têm sido incrivelmente baixos desde a derrota da emblemática greve dos mineiros de 1984-85 pelo governo de Margaret Thatcher. Muitos dos trabalhadores em greve nos últimos meses nunca testemunharam uma ação sindical bem sucedida – não importa a participação ativa nela.

O pico da ação até agora foi em 1º de fevereiro, com mais sindicalistas na Grã-Bretanha em greve em um único dia do que durante décadas. Cerca de meio milhão de trabalhadores de seis grandes sindicatos saíram na primeira tentativa séria de coordenação interprofissional desde que as greves começaram em junho passado. Mas havia um milhão de trabalhadores que poderiam ter sido chamados legalmente naquele dia – que tinham um mandato existente para greve – então esta ação só alcançou metade de seu potencial.

O dia 15 de março parece desigual porque existe uma situação contraditória. No entanto, há algumas boas notícias. Em 1º de fevereiro, o sindicato do funcionalismo público trouxe membros em 124 departamentos. Eles falharam no “limiar de participação” – ditado pelas leis anti-sindicalistas extremamente reacionárias da Grã-Bretanha – em nove outros departamentos por margens estreitas. Eles se reequilibraram nesses departamentos e conseguiram, portanto, em 15 de março, mais 33.000 trabalhadores estaram em greve.

Os dois maiores sindicatos do metrô de Londres estão em greve no dia, o que significa que a rede de metrôs será fechada – e os manifestantes de toda a capital se amontoarão em ônibus para se juntarem aos que vêm em ônibus de fora da cidade para o comício central.

Talvez o elemento novo mais excitante seja os médicos juniores – um termo confuso que cobre os médicos que se qualificaram até 20 anos atrás. Mais de 35.000 deles votaram esmagadoramente a favor da greve e imediatamente anunciaram que fariam uma greve total de 72 horas que terminaria na madrugada do dia 16 de março.

Mas também houve fragmentação em três áreas: educação superior, correio e grande parte do serviço de saúde.

Em 17 de fevereiro, a secretária-geral do Sindicato das Universidades e Faculdades (UCU), Jo Grady, anunciou que a greve planejada seria pausada para negociações intensivas. Ela o fez unilateralmente sem nenhuma consulta – e sem mostrar nenhum progresso concreto na oferta de gestão. Membros furiosos e ativistas foram apresentados com um fato consumado.

Os trabalhadores dos correios não estão em greve desde antes do Natal – após 18 dias de ação antes. Uma nova convocação ocorreu com uma maioria de 96,9% para novas ações. Vários representantes do local de trabalho foram perseguidos e os gerentes estão impondo novos padrões de trabalho – um aspecto significativo da disputa, em primeiro lugar. Apesar disso, a liderança e a gerência do sindicato emitiram uma declaração conjunta em 2 de março. As autoridades afirmam que outras mudanças não serão feitas sem consulta – mas isto poderia ser facilmente utilizado para vincular os representantes do local de trabalho ao policiamento de negócios duvidáveis. Há muita raiva, mas não há um verdadeiro fórum para os ativistas lutarem por uma estratégia alternativa.

Na saúde, há duas áreas principais onde a ação industrial já vem ocorrendo – entre enfermeiros e no serviço de ambulância. O principal sindicato envolvido na primeira é o Royal College of Nursing (RCN), que até pouco tempo atrás tinha uma proibição de ação industrial, mas começou a atacar em dezembro de 2022. Ficou claro desde o início que sua liderança queria que as enfermeiras fossem tratados como um caso especial.

Elas se mantiveram bem afastadas da ação em 1º de fevereiro. Portanto, não foi uma grande surpresa quando anunciaram em 22 de fevereiro que estavam em discussões com o governo. Não inesperadamente, desde então não ouvimos nada sobre o que poderia estar sendo oferecido.

Na última semana, os trabalhadores das ambulâncias concordaram em conversar e cancelaram a ação. O que parece estar em oferta é um pagamento único para o salário do ano passado – que nada faz para combater o salário real perdido durante a última década.

Qual é a profundidade da crise do custo de vida/salário na Grã-Bretanha? Qual é o seu impacto sobre as pessoas comuns?

Existem diferentes elementos para a crise do “custo de vida”. Para a maioria dos grevistas, o valor real de seus salários caiu durante uma década ou mais. Os serviços têm sido minados pela privatização e casualização, o que significa que trabalhadores e usuários têm ressentimentos de longo prazo.

A inflação galopante subiu formalmente no outono passado para mais de 11% – mas com um impacto ainda pior no nível de vida da classe trabalhadora. Os alimentos básicos, combustível e custos de moradia constituem os elementos mais significativos disto.

Muitos têm sido confrontados com dificuldades – com uma escolha entre aquecimento e alimentação. O uso do banco de alimentos elevou-se a um nível em que uma em cada cinco pessoas no trabalho está usando-os!

Esta é uma das principais razões pelas quais as greves têm um apoio público muito amplo. Isto é particularmente verdadeiro para os trabalhadores dos serviços de saúde. A grande maioria das pessoas está desesperada para ver um financiamento adequado para o Serviço Nacional de Saúde, um fim da privatização e um salário decente para acabar com a situação em que, por exemplo, enfermeiras estão saindo para trabalhar em supermercados para ganhar uma taxa horária mais alta lá.

Qual tem sido a resposta do governo Rishi Sunak às exigências dos trabalhadores até agora? O que será necessário para forçar a mão deles?

Este tem sido um momento de turbulência política com três Primeiros Ministros Conservadores diferentes – Boris Johnson, Liz Truss e agora Sunak. Inicialmente todos adotaram uma abordagem de lavar as mãos – enquanto utilizavam a mídia para culpar a inflação salarial pela crise do custo de vida.

Quando ficou claro que os sindicatos não estavam recuando, eles mudaram de rumo. Apesar da Grã-Bretanha já ter as leis anti-sindicalistas mais repressivas, eles começaram a introduzir uma “lei de nível mínimo de serviço” que obrigaria muitos a trabalhar, mesmo votando para a greve. A ironia é que esses níveis muitas vezes não são atingidos mesmo quando não há greves – portanto, certamente não estão ganhando nenhum concurso de popularidade com isso. Eles também começaram a tentar algumas lideranças sindicais em conversações que não abordam as verdadeiras preocupações que levaram às disputas em primeiro lugar.

A geografia política destas greves é complicada – diferentes sindicatos se organizam em diferentes países – Escócia, País de Gales, Irlanda como um todo e às vezes o norte da Irlanda, assim como a Inglaterra. Enquanto os Conservadores estão no governo em Westminster, em Edimburgo há um governo do SNP e em Cardiff um governo trabalhista – ambos fizeram ofertas separadas e melhores para alguns trabalhadores cujas contas de pagamento vêm de seus orçamentos.

Esta onda industrial tem o potencial de gerar um movimento político que poderia desafiar os partidos de austeridade e privatização? Que postura o Partido Trabalhista de Kier Starmer está adotando em relação a ele? Quais são as perspectivas de unir a esquerda em torno de um projeto desse tipo?

A posição do Starmer tem sido terrível – proibir os membros de seu Gabinete Sombra de se unirem às linhas de piquete. Na medida em que ele mencionou as queixas dos trabalhadores, ele enfatizou o quão fiscalmente responsável seria o trabalho no governo.

Alguns sindicatos fizeram movimentos para estabelecer uma campanha política mais ampla, indo além das questões do local de trabalho, para questões mais amplas como moradia e o direito à alimentação. No entanto, isto murchou na videira por falta de estruturas democráticas que pudessem unir aqueles com o compromisso de construí-la. Comitês de solidariedade grevista se desenvolveram em algumas áreas, mas estes não têm uma agenda política ampla.

Se algo disto poderia contribuir para o desenvolvimento de um novo partido político é algo que eu não posso abordar neste artigo.

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O fascismo e a sua política – Antonio Gramsci

Apresentação

Coletivo do CVM

O fascismo constitui uma espécie de “moeda corrente” no discurso da esquerda brasileira contra a extrema-direita, especialmente contra o bolsonarismo. Muito se fala, pouco se entende. O termo até virou chavão de reacionário, em todos os aspectos, inclusive moral.

Para contribuir ao esclarecimento do que venha a ser fascismo, publicamos no portal um documento sobre a experiência histórica mais significativa de enfrentamento e resistência – a do Partido Comunista da Itália nos anos 1921 a 1926.

Trata-se da posição do Partido Comunista da Itália intitulada “O fascismo e sua política”, que faz parte das chamadas Teses de Lyon, assim conhecidas por terem sido aprovadas pelo III Congresso do PCI, realizado clandestinamente em janeiro de 1926, na cidade de Lyon.

Neste congresso, o partido assumiu abertamente o processo de “bolchevização” encaminhado no V Congresso da Internacional Comunista, em 1924, sob a direção de Zinoviev. O combate ao esquerdismo representado por Amadeo Bordiga (abstencionismo político, recusa à palavra-de-ordem do Governo Operário e Camponês) é especialmente destacado, uma vez que correspondia à corrente mais expressiva dentro do partido. Como está escrito nas Teses, tratava-se da “ideologia oficial do partido italiano no primeiro período de sua existência”.

Entretanto, da mesma forma, adverte-se, nas Teses, contra o perigo de uma tendência à direita, mais grave porque estava

…ligado à situação geral do país. A própria compressão exercida pelo fascismo tende a alimentar a opinião de que, estando o proletariado na impossibilidade de abater rapidamente o regime, é melhor tática a que conduz, senão a um bloco burguês-proletário para a eliminação constitucional do fascismo, a uma passividade ativa do Partido comunista na luta política imediata, para permitir que a burguesia se sirva do proletariado como massa de manobra eleitoral contra o fascismo. 

No artigo “O camarada G. M. Serrati e as gerações do socialismo italiano” de 14 de maio de 1926, por ocasião da morte daquele revolucionário e pouco depois do III Congresso, Gramsci assinala a importância de Serrati para o PCI.

Começa por apontar o seu empenho em criar a vanguarda proletária, deixando claro que esta era principal fraqueza do movimento revolucionário italiano: a falta de “um grupo forte e homogêneo de dirigentes revolucionários, que tivesse um estreito contato com o núcleo proletário fundamental do Partido Socialista”. Exigência para acumulação de experiências políticas revolucionárias e para uma direção coletiva capaz de aproveitar as conjunturas favoráveis à iniciativa revolucionária. Uma referência ao fracasso do partido, como aponta Broué, em catalisar a indignação e cólera entre os trabalhadores italianos e até mesmo na pequena burguesia, decorrente do assassinato do deputado socialista Giacomo Matteotti, em 10 de junho de 1924.

Gramsci foi um dos poucos revolucionários italianos que não subestimou o fascismo quando este apareceu no cenário político da Itália. No artigo “Socialistas e fascistas” (1921) analisa o papel do Estado burguês em propiciar a expansão do movimento fascista e critica a posição dos socialistas que se mantém estritamente no terreno da legalidade burguesa e destaca os erros deles, advertindo “Quem tem força, usa”.

Fontes:
– Antonio Gramsci. Escritos Políticos, volume IV. Lisboa: Seara Nova, 1978.
– Pierre Broué. História da Internacional Comunista (1919-1943). São Paulo: Sundermann, 2007.

O fascismo e a sua política[1]

Antonio Gramsci

 

15. O fascismo, como um movimento de reação armada que se propõe o objetivo de desagregar e de desorganizar a classe trabalhadora para a imobilizar enquadra-se no plano da política tradicional das classes dirigentes italianas e na luta do capitalismo contra a classe operária. É, portanto, favorecido, na sua origem, na sua organização e no seu caminho por todos os velhos grupos dirigentes, indistintamente, com preferência, porém, pelos agrários que sentem mais ameaçadora a pressão das plebes rurais. Socialmente, porém, o fascismo encontra a sua base na pequena burguesia urbana e numa nova burguesia agraria nascida da transformação da propriedade rural em algumas regiões (fenômenos do capitalismo agrário na Emília, origem de uma categoria de intermediários rurais, “bolsas de terra”, novas divisões de terrenos).[2] Este fato e a circunstância de ter encontrado uma unidade ideológica e organizativa nas formações militares, onde revive a tradição da guerra (“arditismo”) [3], e que servem de guerrilha contra os trabalhadores, permitem ao fascismo conceber e atuar um plano de conquista do Estado, contrapondo-se às velhas classes dirigentes. É absurdo falar de revolução. As novas categorias que se agrupam à volta do fascismo extraem, porém, da sua origem uma homogeneidade e uma mentalidade comum de “capitalismo nascente”. Isto explica como é possível a luta contra políticos do passado e como podem justificá-la com uma construção ideológica em contraste com as teorias tradicionais do Estado e das suas relações com os cidadãos. O fascismo modifica, na substância, o programa de conservação e de reação que sempre dominou a política italiana apenas numa diversa maneira de conceber o processo de unificação das forças reacionárias. Substitui a tática dos acordos e dos compromissos com o propósito de realizar uma unidade orgânica de todas as forças da burguesia num único corpo político controlado por uma única central que deve dirigir simultaneamente o Partido, o Governo e o Estado. Este propósito corresponde à vontade de resistir completamente a qualquer ataque revolucionário, o que permite ao fascismo recolher as adesões da parte decididamente mais reacionária da burguesia industrial e dos agrários.

16. O método fascista de defesa da ordem, da propriedade e do Estado, ainda mais do que o sistema tradicional dos compromissos e da política de esquerda, bloqueia a constituição dos interesses de classe, atingindo a estrutura social e suas superestruturas políticas. As reações que provoca devem ser examinadas em relação com a sua aplicação, quer no campo econômico quer no campo político.

No campo político, antes de tudo, a unidade orgânica da burguesia ­­­­­­­­­­­­­­no fascismo, não se realiza imediatamente depois da conquista do poder. Fora do fascismo, persistem centros de oposição burguesa ao regime. Por um lado, não é absorvido o grupo que tem fé na solução giolittiana do problema do Estado. Este grupo liga-se a uma secção da burguesia industrial e, com um programa de reformismo “trabalhista”, exerce influência sobre estratos de operários e pequenos burgueses. Por outro, o programa de fundar o Estado sobre uma democracia rural do Mezzogiorno e sobre a parte “saudável” da indústria setentrional (“Corriere della sera”, liberalismo, Nitti) tende a tornar-se um programa de uma organização política de oposição ao fascismo com base de massa no Mezzogiorno (União Nacional). leia mais