A lenda do outubro alemão de 1923

Republicado de Arbeiterstimme ”, nº 221, 2023

 

 

100 anos de 1923

A memória de 1923 é também uma ocasião para a mídia nacional. Foram publicadas pelo menos dez novas monografias que tratam deste ano econômica e politicamente agitado. Muitas vezes ele é visto como um ano chave para a história alemã do século XX.

Para o mainstream burguês, o foco da análise está frequentemente na hiperinflação, que atingiu o seu pico naquele ano, e na sua superação. Mas também o golpe de Hitler e aspectos culturais são discutidos detalhadamente em algumas publicações.

Para muitos na esquerda, porém, há outro foco de interesse. A saber, se a revolta comunista planejada pela Internacional Comunista (KI) para outubro de 1923 teria tido uma possibilidade realista de sucesso.

Se você estuda a história para aprender com ela, precisa em primeiro lugar estar consciente de que as condições estão sempre mudando.

Nos primeiros anos da República de Weimar, a ideia ou, se preferirem, o mito da crise final do capitalismo era largamente difundido também no KPD[1]. Há 100 anos, a possibilidade de uma derrubada revolucionária parecia estar ao nosso alcance.

Isto significa que a situação atual (e provavelmente no futuro previsível) não pode ser remotamente comparada à de 1923. Naquela época havia um movimento operário forte e consciente, com o KPD e o SPD[2]. A guerra e as suas consequências (Tratado de Versalhes) levaram a uma inflação galopante. O empobrecimento em massa prevaleceu numa escala hoje inimaginável na Alemanha.

Portanto, a história certamente não oferece orientações diretas para as nossas ações de hoje. A este respeito, não há aprendizado com a história, no sentido mais estrito!

Contudo, a polêmica em torno dessa história faz sentido e é necessária. As avaliações dos acontecimentos de outubro de 1923 ainda diferem amplamente na esquerda, assim como algumas questões estreitamente relacionadas, como a avaliação da política da Internacional Comunista na época ou de uma política “correta” de frente única.

Algumas pessoas ainda falam sobre a “Revolução Traída” e, portanto, assumem o fracasso pessoal do presidente do KPD, Heinrich Brandler, ou até mesmo a sua traição à classe trabalhadora. As circunstâncias e condições reais são frequentemente ignoradas.

Existem inúmeras revisões e análises científicas das condições da época, que chegam à conclusão de que não existia (mais) uma situação revolucionária naquela época e que a greve teria resultado numa derrota catastrófica com inúmeras mortes. Por exemplo, consultem-se as posições de Harald Jentzsch na revista “Z” nº 116, de dezembro de 2018, “O KPD de 1919 a 1924, Parte II: O ‘outubro alemão’ de 1923”, páginas 181-195, bem como a brochura de August Thalheimer “1923: Uma oportunidade perdida? A lenda do ‘outubro alemão’ e a verdadeira história de 1923”[3], que agora está sendo novamente republicada de forma corrigida.

Esta é razão suficiente para revisitarmos este tópico da nossa perspectiva após 100 anos. Para tanto, reimprimimos um artigo da Arbeiterstimme, que trata da avaliação dos acontecimentos e processos da época. Esta apresentação, que data de 1974, tem em si qualidade histórica e deve ser lida e apreciada tendo em mente este contexto.

Equipe editorial, setembro de 2023

 

A lenda do outubro alemão de 1923

Mas acreditamos que o primeiro pré-requisito para um partido comunista e uma liderança que saiba como vencer é que elimine todas as lendas e comece realmente a aprender. Enquanto esse aprendizado real da própria história real não tiver começado, o partido e com ele a classe trabalhadora apenas continuarão a andar em círculos, em vez de avançar, e o resultado serão novas derrotas e cada vez mais graves.

August Thalheimer

 

Mesmo depois de 50 anos, a lenda do “outubro alemão” ainda assombra as mentes das pessoas, a lenda da revolução perdida ou traída de 1923. Por outro lado, o verdadeiro significado do ponto de virada do outubro alemão” é mal compreendido: a ascensão ao poder da ultraesquerda no partido alemão e a liquidação dos sucessos anteriores dos comunistas, por meio de uma política que acabou por conduzir à maior derrota do movimento operário alemão.

Comparação da situação: Rússia em 1917 e Alemanha em 1923

Uma comparação entre a situação objetiva da Rússia em 1917 e da Alemanha em 1923 precisa mostrar até que ponto estas situações eram realmente comparáveis. Principais fatores que favoreceram a Revolução Russa de Outubro:

  1. Questão da guerra: A grande massa dos camponeses e trabalhadores era a favor da paz e queria acabar com a guerra imperialista. Apenas os bolcheviques assumiram esta posição.
  2. Questão fundiária: Os camponeses afugentaram os grandes proprietários e ocuparam as terras. Apenas os bolcheviques sancionaram esta apropriação de terras.
  3. Nível de consciência da classe trabalhadora: A interrupção do fornecimento de alimentos às cidades e o fechamento das fábricas pelos capitalistas para quebrar o poder dos conselhos operários levaram, logicamente, ao “controle operário da produção” e à expropriação dos capitalistas. Estas medidas também foram apoiadas exclusivamente pelos bolcheviques. Isto é, como a maioria dos trabalhadores e camponeses apoiava os bolcheviques, estes também obtiveram a hegemonia militar (recrutamento militar obrigatório). A derrubada real de outubro foi, portanto, fácil de levar a cabo.

 

Situação na Alemanha

A chamada luta do Ruhr, a ocupação da região do Ruhr pelo exército francês e a resistência passiva contra ela, não foi resolvida pela classe trabalhadora, mas foi interrompida pela burguesia. A Inglaterra e os EUA, em particular, tinham interesse em apoiar a burguesia alemã (a Inglaterra precisava de uma Alemanha burguesa como contrapeso à França; os EUA temiam sobretudo pelo seu capital investido na Alemanha).

O principal fator de crise de 1923, a inflação, foi eliminado pela própria burguesia, por meio da estabilização da moeda. Estas concessões sobre a questão da inflação e da luta do Ruhr dividiram a classe trabalhadora alemã e o KPD não conseguiu obter o apoio da maioria.

A questão das forças armadas também era diferente: o Reichswehr, como exército profissional, estava firmemente nas mãos dos reacionários e contrarrevolucionários.

Os camponeses não eram revolucionários. Tinham conseguido utilizar a inflação para se livrarem das suas dívidas hipotecárias e também se beneficiaram da compressão dos preços, uma vez que os preços dos produtos industriais caíram muito mais do que os preços dos produtos agrícolas.

Assim, acontece que todos os fatores decisivos que levaram à vitória das massas na Rússia em 1917 não estavam presentes na Alemanha em 1923.

 

Situação da classe trabalhadora e do movimento comunista

Na área ocupada pelos franceses, toda a indústria pesada estava paralisada como parte da resistência passiva. Os trabalhadores entraram em greve, mas com o consentimento dos capitalistas, e foram pagos pelo tempo de greve. No resto da Alemanha, a inflação reduziu drasticamente os salários reais, mas quase não havia desemprego, uma vez que a indústria floresceu graças à exportação a preços de pechincha.

Nesta situação, o KPD emitiu reivindicações parciais e palavras de ordem de transição, tais como: transferir o peso da luta do Ruhr para a burguesia, registrar e taxar os ativos reais, controlar a produção, formar comitês de controle dos preços, formar as centúrias proletárias e, como resumo, a palavra de ordem do governo dos trabalhadores, que, com base nos seus próprios órgãos de classe, deveria levar a cabo as reivindicações dos trabalhadores. A questão do poder foi abordada através de palavras de ordem parciais, palavras de ordem de transição e lutas parciais, mas qualquer política aventureira, como a ocupação das fábricas na região do Ruhr sob as baionetas francesas proposta pela “esquerda”, foi rejeitada.

O clímax do movimento de massas de 1923 foi a greve de Cuno. Mas o quão pouco a classe trabalhadora estava preparada para lutar diretamente pelo poder é revelado pelo fato de que algumas concessões foram suficientes para acabar com a greve e permitir que o movimento diminuísse. A formação da grande coalizão, ou seja, a entrada do SPD no governo burguês, despertou novas ilusões na classe trabalhadora, sustentadas pelas medidas imediatas de aquisição de alimentos e estabilização do marco.

 

O plano de ação do Comintern[4]

Na sessão plenária de junho da Executiva do Comintern não houve qualquer menção à “luta revolucionária pelo poder” na Alemanha. Foi apenas com a campanha do KPD para o Dia Antifascista, em 29 de julho, e sob a influência da greve de Cuno, que a Executiva colocou a questão da luta armada na agenda. Uma conferência foi convocada. Brandler e outros camaradas chegaram a Moscou no final de agosto, mas demoraram, trabalhando num plano de ação para a revolução alemã durante sete semanas, enquanto os acontecimentos na Alemanha evoluíam. “A característica desse plano é que ele não foi traçado baseado em fatos já existentes na Alemanha, mas sim que se traçou um plano para semanas e meses seguintes, baseado em uma especulação acerca de acontecimentos que iriam se concretizar ou deveriam acontecer na Alemanha no decorrer de quatro / oito semanas. Na Rússia, em 1917, estabeleceu-se um plano para a sublevação depois da existência, em Leningrado, de uma maioria e favor dos bolcheviques, depois de se ter assegurado do apoio das Forças Armadas, depois de Kerensky ter sido liquidado, quando a situação era madura. O plano de ação para 1923 não era fundado em tais fatos, mas na especulação de que os acontecimentos na Alemanha, de agosto em diante, iam tomar o mesmo rumo que de agosto até outubro na Rússia. Quer dizer: que nesse intervalo o Partido conseguiria atrair a maioria do povo, que nesse período eles poderiam armar suficientemente os operários e que o adversário se tornaria impotente e decomposto. Na Rússia havia se estabelecido um plano baseado em premissas reais para a sublevação, não com semanas de antecedência, como dizia Trotsky, mas alguns dias antes. Para a Alemanha, porém, estabeleceu-se um plano com meses de antecedência. Esse é o fato decisivo. Transferiu-se o esquema do outubro de 1917 para a Alemanha, sem que os fatos correspondessem – simplesmente como especulação!” (Thalheimer, ênfase no original, editor.)

A entrada dos comunistas no governo socialdemocrata saxão também ocorreu apesar da oposição de Heinrich Brandler; apesar das suas preocupações de que as condições para isso ainda não existiam na classe trabalhadora e que estas ainda tinham de ser criadas. O KPD saxão também não concordou com as instruções da EKKI[5].

Outra importante decisão errada foi tomada em Moscou: foi decidido que os comitês de empresa[6] poderiam substituir os conselhos políticos dos trabalhadores.

O conceito de Brandler de iniciar a tomada do poder pelos comunistas aumentando o movimento de massas na Alemanha, por meio de uma greve geral da intensidade daquela que ocorreu após o golpe de Kapp, foi frustrado pela decretação de um calendário revolucionário – defendido principalmente por Trotsky – cuja sequência deveria começar em 1º de outubro de 1923 com a instrução telegráfica da EKKI ao KPD para abrir negociações sobre a participação nos governos estaduais da Alemanha Central.

 

A situação após a greve de Cuno

Entretanto, a situação em que o plano de ação especulativo se baseava havia mudado completamente. A própria burguesia tomou a iniciativa porque era claro para ela que sem concessões à classe trabalhadora o perigo da revolução aumentaria.

Em poucas semanas ela conseguiu pôr fim à batalha do Ruhr e chegar a um acordo com os capitalistas franceses. Igualmente importante foi acabar com a inflação e iniciar a estabilização através da introdução do padrão-ouro. “Se a burguesia acabou com a inflação depois de agosto, isto se deu não só devido ao perigo da revolução, mas também porque os efeitos da inflação se inverteram de certo ponto em diante, quando a inflação não mais agiu como prêmio para a exportação, mas pelo contrário. A burguesia aproveitou a conjuntura da inflação com bastante frieza até o fim. Ela foi até o ponto mais longe possível e parou definitivamente somente quando a conjuntura da inflação começou a se transformar na crise da inflação.” (Thalheimer)

“O erro decisivo na ação do Partido consistiu no fato de que ele encarou com confiança o plano de ação elaborado; que deixou de preparar politicamente a luta pelo poder; que se restringiu a preparativos técnico-organizatórios. Trotsky tinha declarado: ‘A política é feita pelo adversário’. Ele tinha a opinião de que a falha principal dos revolucionários do Ocidente até agora tinha sido a pouca valorização dos preparativos técnicos-organizatórios do levante. A política, é verdade, foi determinada pelo adversário e muito em função dele, enquanto o erro básico do Partido depois da greve de Cuno foi de não fazer política, de deixar de fazer a preparação política por lutas parciais e ações parciais e se limitou à preparação técnico-organizatória.” (Thalheimer)

Por decisão da Executiva, os comunistas entraram no governo da Saxônia em 12 de outubro e, pouco depois, no governo da Turíngia. O partido deveria usar o aparato governamental para armar os trabalhadores. Mas é claro que o Reichswehr[7] não “ignorou” este fato. Quando Böttcher pediu que os trabalhadores fossem armados, o General Müller, com o consentimento de Ebert, fez com que o Reichswehr marchasse. Mostrou-se assim que a resistência de Brandler em Moscou era justificada. “Só poderia ter participado de um governo sob a condição de ser capaz de agir como se deve agir como comunista e revolucionário, para repelir a resistência da burguesia. Mas isto só pode ser feito com base no consentimento da maioria dos trabalhadores à ditadura, com base nos trabalhadores armados, numa revolta já vitoriosa.” (Thalheimer)

No dia 20 de outubro, a Central do KPD decidiu por unanimidade que uma greve geral, que incluísse a luta armada, deveria ser declarada devido à invasão do Reichswehr. Mas depois foi decidido que se deveria esperar até à Conferência de Chemnitz, no dia 21 de outubro, na qual representantes de conselhos de trabalhadores e de outros outras entidades de trabalhadores deveriam discutir questões econômicas, a fim de descobrir o verdadeiro estado de espírito. “Na conferência o camarada Brandler, com o consentimento da Central, exigiu que a conferência lançasse a palavra de ordem de greve geral como senha de combate contra a invasão do Reichswehr. Fosse ali um ambiente verdadeiramente revolucionário, pronto para a luta pelo poder, então certamente a reunião deveria ter aceitado esta senha com entusiasmo e, necessariamente, da greve geral teria se evoluído para a luta armada pelo poder. O fato, porém, era muito diferente. A proposta de Brandler simplesmente caiu por terra na reunião. Os presentes reagiram à proposta de maneira glacial. Depois aconteceu o seguinte: o ministro Graupe da esquerda do SPD usou da palavra dizendo que ele e seu grupo de sete pessoas deixariam a conferência caso os comunistas não desistissem de colocar a questão da greve geral (na conferência). Numa assembleia realmente revolucionária e decidida para a luta, uma tempestade de indignação teria varrido os derrotistas. Mas aconteceu o contrário. A conferência decidiu desistir da declaração imediata da greve geral e, em lugar disso, deliberou nomear uma pequena comissão para decidir a respeito. Isso era um enterro de terceira classe.” (Thalheimer)

Isto significava que a classe trabalhadora estava dividida e a maioria apoiava os comunistas em alguns lugares, mas não em toda a Saxônia e nem em todo o país. Assim, a Central decidiu por unanimidade bater em retirada, incluindo os votos da “esquerda” e dos representantes do Comintern Radek e Piatakov. “Se não tivesse sido tomada essa resolução, se o partido tivesse arriscado um choque com o adversário superior, dele só teria sobrado uma mancha molhada. Outros, num caso desses, agiram diferentemente. Por exemplo, na Bulgária e outros exemplos semelhantes. Mas não convidam à imitação. Nenhuma direção partidária pode justificar a entrada numa luta decisiva, quando prevê a derrota certa. Pode-se objetar que já houve algumas situações em que o Partido e o operariado lutaram com a perspectiva da derrota. Está certo que lutamos em janeiro de 1919 quando ninguém tinha a esperança de conquistar o poder. Lutamos também em Munique quando cada um sabia que não se tratava de conquistar a vitória. A diferença é: nesses casos era a luta da grande maioria do operariado e, em tal situação, o Partido não podia trair o operariado. É diferente quando a luta é desencadeada pelo Partido e as massas não aderem, quando a derrota é causada pelo Partido, por sua tática errada, por sua avaliação errada da situação. Isso não elevaria o Partido os olhos das massas, mas o desacreditaria.” (Thalheimer)

 

A lenda de outubro e suas consequências

Zinoviev, o presidente do Comintern, também aprovou as táticas de outubro do KPD. Mas em dezembro, ele denominou as suas políticas como uma “combinação parlamentar banal”. A causa da mudança foram as lutas de facções no Politburo do PCUS, que não se baseavam em disputas políticas de poder, mas sim na difícil situação da União Soviética (efeitos da guerra civil, cerco imperialista). Trotsky contra Zinoviev, Kamenev e Stalin. Trotsky – através dos seus seguidores Radek e Piatakov – bem como Zinoviev – sob cuja presidência o EKKI tinha decidido a política saxônica – parecia oprimido pelo resultado negativo da aventura de outubro. Zinoviev tentou transferir a culpa pela derrota de outubro para a Central do KPD conduzida por Brandler-Thalheimer. Sob o impacto de um discurso de Radek, no qual ele afirmou que se a maioria do Politburo se declarasse contra Trotsky, a Central do KPD o apoiaria, Zinoviev finalmente voltou-se contra a “direita” na Alemanha e a visão representada por ela e Radek. As relações de força mudaram objetivamente; a insurreição teria levado à derrota completa do partido. Em 27 de dezembro, as opiniões de Radek foram condenadas pelo Politburo.

August Thalheimer escreve: “Foi simplesmente a consequência de uma manobra na luta de facções internas da Rússia. Desse discurso de Radek, soubemos somente muito mais tarde. A campanha, o fogo cerrado, estava em pleno andamento, Maslow e companhia haviam sido soltos, quando nós soubemos em Moscou – no período do V Congresso – da verdadeira causa da virada. O fato singular é que essa afirmação de Radek era invenção.”

A Executiva do Comintern ajudou os ultraesquerdistas Ruth Fischer e Maslow, juntamente com Thälmann, Remmele e Neumann, a liderar o partido. O curso ultraesquerdista experimentou o seu primeiro crescimento.

A lenda de outubro atingiu agora o seu clímax. Uma resolução da conferência distrital do KPD da Renânia-Vestfália, sob a égide de Ruth Fischer, dizia: “A conferência declara que a luta revolucionária decisiva em outubro do ano passado era historicamente necessária. Não era permitido nem a fuga diante da luta, nem a substituição da luta final pelas chamadas batalhas de retirada, ações parciais ou similares.”

Trotsky escreveu no seu panfleto “As lições de outubro”: “Ainda mais interessante é a questão da derrota do proletariado alemão em outubro do ano passado. Assistimos ali, no segundo semestre do ano passado, a uma demonstração clássica de que se pode perder uma situação revolucionária extremamente favorável e de importância histórica mundial.”

No início falamos de um ponto de viragem no desenvolvimento do movimento comunista alemão. Isto aparece, por um lado, na intervenção massiva do Comintern, dominada pelo PCUS, no partido alemão, que se tornaria mais frequente a partir de agora, e, por outro lado, na implementação da linha ultraesquerdista, que acabaria por levar à derrota.

A ultraesquerda declarou que a tática da frente única era errada e oportunista. A conquista dos sindicatos também foi abandonada; Maslow emitiu a palavra de ordem de “destruir os sindicatos”. A “bolchevização” do partido foi iniciada. A tarefa imediata declarada foi a de “organizar a revolução, liderar vitoriosamente o proletariado na revolta armada e estabelecer a ditadura do proletariado”. Maslow escreveu: “A situação permanece objetivamente revolucionária.”

No espaço de um ano, a grande influência do KPD foi desperdiçada e o partido ficou isolado. Por trás dessas contradições com a política da antiga Central estava uma avaliação fundamentalmente diferente do papel do Partido Comunista. Enquanto a antiga Central, no espírito de Rosa Luxemburgo e do núcleo marxista da Liga Spartacus, via o partido como um instrumento da classe trabalhadora para levar a cabo a revolução, a “esquerda” era dominada pela visão de que o partido não teria que ser a vanguarda, “mas sim o motor do proletariado”, deveria fazer a revolução.

(Todas as citações de August Thalheimer foram retiradas da brochura 1923: Uma revolução perdida? publicada em 1931 na Juniusverlag Berlin).

Revisão de tradução: SAP

Notas:

[1] KPD = Partido Comunista Alemão [NT].

[2] SPD = Partido Socialdemocrata Alemão [NT].

[3] Ver texto no portal do CVM.

[4] Internacional Comunista [NT].

[5] EKKI = Comissão Executiva da Internacional Comunista [NT].

[6] Betriebsräte [NT].

[7] Exército. [NT]

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